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Os Tiroteios de Lampião Contra Quelé Por:Rostand Medeiros

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Seja através de uma, ou de outra versão, o certo é que tempos depois desta desavença no seio do bando, o chefe Lampião, apoiado pelo fazendeiro Marcolino Diniz (foto ao lado), filho do coronel Marçal, vem para Santa Cruz com o objetivo de matar Clementino e seus irmãos. Este encontro ocorreu no dia 5 de janeiro de 1924, um sábado. Antônio Ramos informa que era um “-Meninote de doze anos”, que a sua casa antiga era próxima a sua atual morada e seu pai possuía uma bodega pequena, mas bem surtida.



Era ainda de madrugada, quase amanhecendo, quando o jovem Antônio Ramos acordou com o barulho de muitas vozes de homens no oitão da sua casa. Era um grupo numeroso de cangaceiros. O garoto notou que todos vinham alegres, animados, equipados, armados e com muita munição. Muitos deles estavam embalados por aguardente e segundo suas próprias palavras, os cangaceiros pareciam estar “-Com fogo saindo pelas orelhas”. 

Eles pediram tudo que seu pai tivesse de comida no estabelecimento, além de mais cachaça. Este prontamente passou a servir o bando, especialmente Lampião. Os homens armados não fizeram nada com seu pai ou sua família nesta ocasião. 
Antônio assistiu Lampião comendo uma rapadura com queijo e comentando alegremente com a rapaziada sobre a futura luta. Ele se apresentava animado, doido para brigar. Neste momento pronunciou uma frase que Antônio Ramos jamais esqueceu.


“-Da família de Quelé, hoje só se salva quem avoa”. 
O Rei do cangaço ainda afirmou que 
“- Hoje eu vou beber o sangue de todo mundo”. 


Nesta ocasião, durante o nosso encontro, o nonagenário entrevistado alterou-se, ficando visivelmente emocionado. Ele recordou que se tremeu todo, no momento que escutou estas frases do famoso bandoleiro. Comentou veementemente que viu Lampião falar exatamente da forma anteriormente descrita e narrou este fato agarrando fortemente o braço do autor, tal a emoção.


Ele descreveu Lampião como sendo moreno, alto, rosto comprido, cego de um olho, não usava óculos naquele dia e que mesmo assim enxergava bem. Pouco tempo depois o bando saiu da bodega. 


A desproporção da luta que se avizinhava era enorme, pois Quelé tinha junto com ele apenas outros cinco companheiros para lhe ajudar. Para Antônio Ramos os cangaceiros seriam em torno de “-Uns cinquenta homens”. Já Carvalho (op. cit.) afirma que seriam quarenta e cinco. O pesquisador Geraldo Ferraz de Sá Torres Filho (in “Pernambuco no tempo do Cangaço-Volume I”, 2002, págs. 328 a 330) reproduz o “Boletim Geral nº 05”, emitido pela polícia pernambucana no dia 7 de janeiro de 1924, onde consta que o número de cangaceiros era de sessenta homens. 

Casa fortaleza, de Quelé

Mas diante da resistência feroz realizada por Clementino e seus companheiros, a polícia se deslocou para evitar a pecha de conivência e covardia. Apesar da evidente falta de vontade dos policiais de irem a lutar, ficamos imaginando o conflito dentro da própria volante, entre aqueles que queriam ir e dos que não queriam, pois certamente nem todos eram covardes e honravam a farda que vestiam.

Mas para os familiares de Antônio Ramos, naquele momento o que importava era buscar de alguma maneira se proteger dentro de casa diante do que iria acontecer e em pouco tempo “-A bala comeu”. Ele e seus familiares ficaram escutando o tiroteio, mas não lembra a duração, só comentou que “-Demorou muito”. Falou que “-Quando deu fé”, chegou a sua casa um rapaz da família de Quelé com cerca de 16 anos, dizendo que estava dentro de um partido de mandioca quando os cabras chegaram e comentou que “-A bala tava cortando tudo”. Narrou que o rapazinho tinha escutado os gritos dos cangaceiros prometerem “-Derrubar a casa” e o pessoal da casa avisando aos gritos para os atacantes que “-Se derrubar e entrar um, nóis mata na faca”. 



A testemunha da batalha de 5 de janeiro de 1924 afirmou que este rapaz avisou que iria a Triunfo buscar uma volante. Nesta cidade o delegado era o tenente Malta e havia uma volante comandada pelo sargento Higino José Belarmino.  Entretanto, para nosso entrevistado, a polícia ficou “insonando”. No seu linguajar típico, onde Antônio Ramos utilizava expressões difíceis de serem ouvidas atualmente no sertão nordestino, ele quis dizer que os homens da lei ficaram enrolando e só foram chegar a Santa Cruz por volta das 11 horas da manhã.


O jovem disse que seguiria através de um caminho alternativo, evitando a vereda que levava normalmente para esta cidade, pois com certeza os cangaceiros deviam ter “-Botado uma emboscada aculá na frente”. O jovem deixou a casa de Ramos, seguindo em direção a serra dos Nogueiras, saindo no lugar chamado Gameleira e de lá para Triunfo. 
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Esta volante levou várias horas para percorrer os seis quilômetros entre as duas localidades. Provavelmente para os policiais, a ocorrência em Santa Cruz era um problema entre bandidos e quanto mais deles se matassem entre si, melhor.



Continua...
Rostand Medeiros
Fonte:http://santacruzbaixaverde.blogspot.com
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4 comentários:

  1. Carissimos amigos Severo e Rostand<
    parabéns pelo texto e pela publicação, a construção do artigo e a pesquisa séria é um legado para os estudos futuros, um rico conteúdo e uma grande fonte de informação.

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  2. Severo esse conujunto de postagens sobre o Quelé foi sensacional, parabens ao amigos do Cariri Cangaço e ao Rostande.

    Demetrius

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  3. Muito boa a materia amigo Severo, o escritor Rostand Medeiros conseguiu com maestria narrar essa passagem do epico combate entre Quelé e Lampião, ao longo dos anos.

    Uma coisa eu gostaria de ressaltar e que Rostand nos traz mais uma vez a tona; que era, a pouca disposição de algumas volantes em combater os cangaceiros, na verdade em muitas outras oportunidades houve coisas do gênero, inclusive com célebre combate de Chico Chicote.

    Martinho Alencar

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  4. Abraços ao querido amigo João de Sousa, um grande irmão.

    Caro Demetrius, Rostand é realmente esse talentoso pesquisador, já conversei com ele várias vezes o provocando a escrever sobre suas andanças e pesquisas, vamos aguardar!

    Companheiro Martinho, satisfação reencontrá-lo por aqui, seja sempre bem vindo; só um registro, não se vc quiz se referir ao caso do cerco à Casa de Chico Chicote, o famoso fogo das Guaribas; pois bem, ali, o comandante da volante, José Bezerra sabia que não estava combatendo Lampião, ele realmente estava determinado a acabar com a vida de Chico Chicote, fato que fatalmente ocorreu.

    Abração,

    Manoel Severo.

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