A morte do grupo de Azulão; Maria, Zabelê e Canjica pela Volante de Zé Rufino na Lagoa do Limo, em Mairi, Bahia... Na citação abaixo Nascimento descreve a figura de Maria de Azulão.
[...]
Maria de Azulão, morena esbelta e vestia a caráter. Trajava roupa para entrar
no mato, visto que as mulheres do cangaço usavam dois trajes, um para o mato e
outro para a cidade. No reinício das atividades usava roupa nova. Era vestido
de mescla acinzentado, cujo comprimento ia a baixo dos joelhos; manga até os
punhos, remendadas por galões coloridos. No tórax, à altura dos seios, outros
calões enfeitavam o traje da sertaneja, natural de Jacobina Bahia.(Nascimento p 225)
As cabeças foram
transportadas em sacos, expostas para fotografia em Mairi e depois seguiram
para o Instituto Nina Rodrigues em Salvador. Ainda de acordo com o velho Pedro,
próximo do local havia uma roça de mandioca que ficou totalmente arrasada com o
tiroteio.
Zabelê, Maria de Azulão, Azulão e Canjica
Sepultadas no Cemitério da Quintas do Lázaro
Segundo meus
avós moradores da região foram vistos dois cabras e uma mulher, sobreviventes
do conflito passaram próximos a uma fazenda no povoado de Maracujá[1] e
seguiram em direção a Senhor do Bonfim. Antes de chegar a Lagoa do Limo, todavia, o bando de
Azulão passou pela casa de minha tia avó Joana Ferreira, moradora do Bom Sucesso
no município de Mairi, quando este ainda adotava a toponímia de Monte Alegre. De acordo com depoimento de minha avó Vitalina
Ferreira Dias, no ano de 1933 um grupo de cangaceiros passou pela casa de sua
irmã Joana Ferreira, moradora do Bom Sucesso. De acordo com ela, os “cabras”
chegaram à tardinha e foram logo pedindo comida, mas a velha disse que não
tinha a “mistura”, no caso o complemento de carne animal (frango, bode, boi,
caça, etc).
Foto atual da casa da Lagoa do Limo
Fonte:http://cangaconabahia.blogspot.com.br
Naquela ocasião passava pelos arredores da casa uma novilha do
coronel Manoel Juazeiro[2],
os bandoleiros abateram a novilha a rifle e depois que tiraram parte do couro pediram a ela que aprontasse. Contava à velha que eles foram muito gentis com
ela, alguns pilheriavam, contavam casos. Foi uma noite muito alegre, a anciã tinha
uns tachos grandes de barro nos quais eles ajudaram na preparação da
carne e, quando
se retiraram pela madrugada lhes deram uma grande soma em dinheiro, mas embora
ela nunca revelasse o valor, sabe-se que não foi pouco, porque dona Joana
Ferreira pôde adquirir uma propriedade e criar gado com o dinheiro recebido.
Consta ainda da tradição oral que quando os cangaceiros partiram, o marido dela,
temeroso, pediu que ela queimasse imediatamente o dinheiro, porque a volante
podia imputar-lhes a acusação de coiteiros, mas dona Joana não se intimidou, ao
contrário e espertamente, enterrou o dinheiro e só depois de algum tempo foi
usá-lo. Confirmava a minha
avó foi esse dinheiro que ela comprou sua própria terra e até gado, já que
antes ela morava de agregada nas terras do coronel Manoel Juazeiro, aqui já
citado anteriormente. Esse Azulão já citado diversa vezes era o
terceiro; o baiano nascido na Várzea da Ema. No Cangaço tinha esta pratica dos
indivíduos adotarem o nome dos anteriores, Lampião estrategicamente, ao morrer
um cangaceiro, o próximo recrutado levava o nome do antigo e assim ele confundia
seus perseguidores.
Vicente Figueiredo, Oleone Fontes e Jornalista Mauricio
Curiosamente no
livro “Lampião na Bahia” do escritor e historiador Oleone Coelho Fontes,
editado em 1988, o autor comete um equivoco com relação ao nome da fazenda
Lagoa do Limo local onde foi abatido
o bando de Azulão. A página 314 da obra mencionada, Fontes denomina a Lagoa do
Limo como Lagoa do Lino, entretanto,
ao conversarmos com o próprio escritor ele admitiu o equivoco cometido, mas podemos
perceber que permanece uma grande lacuna na historiografia brasileira, pois a
maioria dos historiadores e escritores que produzem sobre o cangaço não se aprofunda
em suas pesquisas e nem faz uma análise historiográfica crítica, algo que não
se aplica a Oleone Coelho, porquanto, muito embora não seja um autor que se
ocupe da interpretação dos fatos históricos, cuida com zelo de pesquisar e
levantar fontes, notadamente as fontes orais, as quais concede espaço generoso
em seus trabalhos.
O historiador e estudioso do assunto Manoel Neto, tem um
analise pertinente sobre isso, segundo Neto " o sujeito lê um livro, mas escreve
dois, sem pelos menos fazer um estudo profundo da temática". O episodio da Lagoa
do Limo é bom exemplo disso. Ao longo dos meus estudos sobre o cangaço tenho
percebido que grande parte dos pesquisadores, historiadores e escritores
repetem-se incidindo no erro cometido por Coelho Fontes. A citação abaixo se refere ao
combate da Fazenda Lagoa do Limo em 1933. Oleone escreveu: e Jaynes
Billy Chandler, em seu livro “Lampião, o Rei dos Cangaceiros[3]”,
como também, Frederico Pernambucano de Mello, em “Guerreiros do Sol[4]”,
engrossa essa a lista que foi crescendo.
Vicente Figueiredo, Isabel Queiroz, Manoel Neto e Antonio Olavo
[...] Mais homens de Lampião iriam tombar, no
mês seguinte, no dia 19 na fazenda Lagoa
do Lino (grifo nosso), município de Monte Alegre (hoje Mairí). Naquele mês
havia seguido para a zona de Mundo Novo e Monte Alegre 3 volantes, pois corriam
rumores de que Azulão e 5 cangaceiros operavam naquelas bandas. Quando os
policiais chegaram à fazenda onde, segundo declarara o informante, se achavam
alojados os bandidos, encontraram apenas 1 mulher que disse não ter
conhecimento do paradeiro deles. Duas meninas se aproximavam da casa,
interrogadas, informaram que alguns homens estavam bem ali pertinho se
alimentando. A policia, cercada dos devidos cuidados, aproximou-se e abriu
fogo, conseguindo ferir gravemente 4 dos 6 bandidos, numa luta que durou mais
de 15 minutos. Em seguida, a volante acabou de matar os feridos,
decapitando-os. As cabeças, depois de expostas em Monte Alegre , foram
levadas para Salvador e mostradas no Instituto Médico-Legal Nina Rodrigues,
para uma multidão de curiosos. (FONTES, P. 314)
A Lagoa do Limo
nunca foi do Lino, isso é um erro factual, pois ela sempre se chamou Lagoa do
Limo. Quem costumava dar essas denominações às lagoas eram os vaqueiros, como
pontos de encontros na caatinga, já que naquela época o gado vivia solto, não existindo
cercas. O processo de cercamento em grande parte do sertão nordestino só se daria
à partir da década de 1950, mas até hoje existem algumas regiões que o gado
vive solto na caatinga, como por exemplo, na região de Jaguarari no sertão baiano.
De acordo como meus avós, moradores de região, a Lagoa tinha esse nome porque
era uma lagoa muito funda e quando chegava à época das chuvas de trovoadas ela
enchia e passava um longo período de cheia, produzindo em decorrência um grosso
limo por cima da água, daí o nome Lagoa do Limo.
Professor Vicente Figueiredo
Historiador - Salvador - Ba - Centro de Estudos Euclydes da Cunha / UNEB
FONTES CONSULTADAS
BIBLIOGRÁFICAS
CASCUDO, Câmara Luís da. Viajando o sertão. 4º Ed. Editora global. São Paulo 2009.CHANDLER, Billy Jaynes. Lampião reis dos
cangaceiros. Rio de janeiro:paz e terra 1981.FONTES, Oleone Coelho. Lampião na Bahia. Petrópolis: vozes, 2008.LINS, Wilson. O médio são Francisco: uma sociedade de pastores guerreiros. 3º Ed.
Editora nacional. São Paulo-1983.MELLO, Frederico Pernambucano. Guerreiros do
sol: o banditismo no nordeste do Brasil. Ed. A Girafa. São Paulo, 2004. NASCIMENTO, José Anderson. Cangaceiros, coiteiros e volantes. -são Paulo:
Editora Ícone, 1998. PERICÁS, Luiz Bernardo. Os cangaceiros: ensaio de interpretação histórica. Editorial
Boitempo São Paulo-2010.VILLA, Marco Antonio. Vida e morte no sertão: história das secas no nordeste nos XIX e XX.
São Paulo: editora Ática-2001.
IMPRESSAS;
1º. Um aspecto dos flagelados em jacobina,
Estado da Bahia, terça-feira, 14 de março de 1933, p. 1º.
2º. Êxodo dos sertanejos, Estado da Bahia,
sábado 21 de janeiro de 1933, p. 1º.
3º. O celebre vampiro Dusseldolf, Diário da
Bahia, sexta-feira 25 de abril de 1933, p. 3º.
4º. REVISTA, Memória da Bahia, o ciclo do
cangaço, editada pela universidade católica de Salvador, com grandes matérias
do Correio da Bahia. Salvador, 2002, p 20 a 26.
ORAIS: 5º. Depoimento de minha
avó Vitalina Ferreira Dias, de 82 anos. Depoimento de meu tio Pedro Lopes, em
dezembro de 2011.
6º. A narrativa do meu pai Osvaldo Lopes de Silva em
dezembro de 2005.
ELETRÔNICAS;http://www.cidades.ibge.gov.br/painel/painel.php? lang=&codmun=292010&search=bahia%7Cmairi%7Cinfograficos:-dados-gerais-do-municipio.
[1]
Povoado pertencente ao município de Serrolândia, cidade do semiárido baiano.
[2] Poderoso
fazendeiro e latifundiário domiciliado naquela zona.
[3] CHANDLER, Billy Jaynes. Lampião reis dos cangaceiros.
Rio de janeiro:paz e terra 1981.
[4] MELLO, Frederico Pernambucano. Guerreiros do sol: o
banditismo no nordeste do Brasil. Ed. A Girafa. São Paulo, 2004, P. 418,
(legenda fotográfica)
Meus agradecimentos aos nobres amigos do Cariri Cangaço especialmente a Manoel Severo que me deu oportunidade dessa publicação.
ResponderExcluirUm forte abraço a todos os amigos do Cariri Cangaço.
meu pai afirma que aos 8 anos de idade junto com seu pai trabalhou na roça desta fazenda e que o nome correto e "fazenda do limo"
ResponderExcluirParabéns pelo excelente trabalho!
ResponderExcluirMeu faleceu com 104 anos e sempre contava essa história pra gente.Nos moramos em Quixabeira próximo desse local e ele sempre dizia que o nome certo era Lagoa do Limo.
ResponderExcluir