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Padre Cícero e Virgulino ? Por:Manoel Severo

Padre Cícero Romão Batista

Padre Cícero e Virgulino Ferreira ? Sobre essa ligação, apesar de não me considerar devidamente credenciado, permitam-me fazer algumas reflexões sobre o referido episódio da visita de Virgulino Ferreira a Juazeiro do Norte. 

Poderia começar provocando e ressaltando alguns pontos dentro do contexto da época. Juazeiro já era considerado naquele momento um grande centro desenvolvimentista da região, tanto pela presença da figura carismática de Padre Cícero, como pela projeção política que alcançou a partir das articulações do próprio Floro Bartolomeu, daí ser um ponto forte e vital para o governo central na luta contra a Coluna Prestes. Na minha maneira de ver, Padre Cícero em nenhum momento cogitou a convocação, convite, ou coisa que o valha, com relação a Virgulino Lampião fazer parte dos Batalhões Patrióticos, sob o comando de Floro e formado para defender o sul do Ceará contra a referida Coluna.

Penso que o grande articulador do convite a Lampião foi mesmo Floro Bartolomeu; médico baiano, deputado federal sob as benção de padre Cícero e que via na figura do líder cangaceiro um trunfo a mais para suas hostes, já enormemente formada por jagunços, cangaceiros, pistoleiros e tudo o que de pior havia por aquelas terras secas do sertão. Floro chegou a ter sob seu comando um grupo de mais de 500 homens, e Lampião, a meu ver, seria uma "jogada de mestre"; ao mesmo tempo imprimiria simbolicamente mais força à sua trôpega tropa e criava uma condição mais favorável para que o líder da família Ferreira pudesse criar menos problemas.


Padre Alencar Peixoto e Floro Bartolomeu

"Floro Bartolomeu, era um médico de Salvador que morou 18 anos em Juazeiro. Ele sempre seguiu a orientação política dos gaúchos. Em 1914 na Sedição de Juazeiro teve o apoio do senador Pinheiro machado, Hermes da Fonseca e em 1926 contava com o prestigio do general Setembrino de Carvalho. A sua lealdade aos gaúchos lhe valeu o titulo de General honorário do Exercito Brasileiro." Ressalta o pesquisador Antonio Pereira Cariry e continua:
"Em tempo essa sua reflexão sobre a estada do rei dos cangaceiros na cidade do Padre Cícero. Havia me dedicado a pesquisa da Sedição de Juazeiro que finalmente conclui a parte de pesquisa e já estou investigando os fatos narrados e obscuros ocorridos em 1926. A vinda de Lampião a Juazeiro acontece no momento crucial da vida de Floro Bartolomeu condenado à morte por uma facção política local liderada pelos "filhos da terra" e alguns adventícios que não comungavam com o prestigio político do médico do padre Cícero, entre eles o turco Benjamin Abraão. A verdade é que havia um plano macabro para o fim de Lampião em Juazeiro. A noticia da morte de Floro no Rio de Janeiro abortou o plano dos "filhos da terra". Há muito mistério e pouco se fala deste tema dentro do Juazeiro".

O fato é que nada disso aconteceu. Floro acabou morrendo no dia em que Lampião visitava Juazeiro do Norte, em março de 1926; dessa forma, a "batata quente" acabou caindo nas mãos de Padre Cícero. Com certeza e digo com muita segurança, padre Cícero sabia o que estava sendo tramado; nada ou quase nada acontecia no nordeste sem quem o santo do Juazeiro soubesse; assim, me parece que devido às circunstâncias, o padre não teria conseguido dissuadir a Floro, e ao mesmo tempo talvez esperasse que a empreitada não se confirmasse, daí alguns autores falarem de sua surpresa com a chegada do rei do cangaço em Juazeiro do Norte.

Padre Cícero e Abraão Benjamim

Sálvio Siqueira revela:"Com certeza, nada se passava no Ceará e região, no Nordeste mesmo, em termos de política, sem que o Padre Cícero soubesse. Claro que a carta/convite encaminhada para Lampião foi redigida e encaminhada pelo próprio Floro Bartorlomeu. Mas, após o envio, adoeceu e teve que ir tratar-se na Capital do País, na época, Rio de Janeiro, onde vai a óbito. Floro, com suas ligações, essas devido sua aproximação ao Padre, recebe uma soma muito alta para 'criar' o Batalhão Patriótico na Juazeiro do Norte, do Governo Federal. O acordo ficou em torno de Mil Contos de Réis, desculpem não saber escrever o valor em cifra, e como primeira parcela, ele recebe quinhentos contos de réis. Com todo o gasto, soldos, construção(reforma), alimentação, material bélico, etc e etc., a quantia acaba... Na sequência, o governo cearense, que apoiava Floro( Padre Cícero) cai. Perdendo esse 'trunfo' na manga, as coisas começam a escacear para o lado de Floro, que fica sem receber a outra metade, os outros quinhentos contos em atraso. Acreditamos que um dos motivos foi que algum órgão do Governo Federal abre investigação do porquê do envio de tão alta quantia para o Ceará, mais especificamente, para Juazeiro, e assim, a outra parte nunca foi enviada".
"Na leitura de autores da grandeza e credibilidade, como Francisco Teixeira e Lira Neto, eu entendo que, nas entrelinhas desse fato histórico, o Padre era consciente da dimensão do seu prestígio político e religioso, e ele, unicamente ele, poderia ter reprovado a articulação do Floro, e mais ainda, pela veneração do Lampião ao Padre, não vejo em momento algum, a ousadia de Virgulino em pressionar Cícero - na ausência de Floro - para obter a "simbólica patente" que não teve valor oficial. Embasado por tamanha força social, o padre poderia, se discordasse, perfeitamente cancelar todo e qualquer ato, bem como nem permitir a permanência por 3 dias do referido grupo e seu líder nas terras da sua Juazeiro. Desconfiado com era, a meu ver, o cangaceiro jamais levaria sua trupe ao Juazeiro nem ele iria pessoalmente atender o convite de Floro, que ele nunca tinha visto (quem danado é esse homem?) Mas o convite do Santo de sua veneração....irrecusável! Vemos ainda o valor da gratidão do Lampião, pelo acolhimento das suas irmãs, e D. Mocinha, desde 1918. A família Virgulino na clássica foto do Juazeiro é ímpar. Em outra foto, Virgulino trocou o chapéu de cangaceiro por um de "massa', a roupa de brim por um elegante terno "risca de giz"...a imagem do novo homem, agora "capitão" pronto a se enquadrar nas leis sociais como autoridade pública. Se o venerável padre não reprimiu....autorizou!...a história é suas múltiplas interpretações! " Pontua o pesquisador Urbano Silva de Caruaru.
"Também acredito que não partiu do padre Cícero a ideia de convidar Lampião para fazer parte do Batalhão Patriótico. Mas, nada se passava no Cariri cearense, que ele não soubesse. É só ler as suas correspondências, e aí temos a noção do quanto ele agia nos bastidores. Interferindo na vida e no destino de ricos e pobres. Quem não gostaria de ser informante do Padrinho?" Fala Chagas Nascimento,            pesquisador de Mossoró.
Assim, consoante às considerações de pesquisadores renomados e de novas teorias e elementos de pesquisa, trago minha humilde opinião: Padre Cícero não teve nenhum ingerência com relação ao convite para que Lampião viesse a Juazeiro, nem tão pouco recebesse a famosa e polêmica patente de capitão.
Manoel Severo - Curador do Cariri Cangaço

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