Um dia
eu conheci o escritor Ariano Suassuna e conversei com ele. Não foi por muito tempo,
mas valeu o papo. Foi quando o vate visitou Quixeramobim no final do ano da
graça de 2011. Fico pensando hoje que poderia ter tirado uma foto para
registrar aquele momento. Mas ele estava tão emocionado por adentrar a casa em
que nasceu Antônio Conselheiro que respeitosamente hesitei. Acho que fui também
tomado por aquele sentimento catártico.
"Suassuna
lacrimejava em silêncio."
Depois
ele comentou com todo mundo que ali o rodeava que o livro Os Sertões foi um
componente fundamental de sua formação intelectual. Que foi lendo Euclides da
Cunha que se deparou pela primeira vez num livro com a gente simples e a
paisagem que conhecia. E que aquela saga de Antônio Conselheiro e sua gente –
que teve início ali naquela casa – era também a história dele. Era a história
de todo o sertão. Era um Brasil que não se conhecia. Era o Brasil Real. Não o
Brasil Oficial. Impossível não se emocionar com depoimento tão vivo e
espontâneo.
Ariano recebe do Cariri Cangaço comenda de
"Personalidade Eterna do Sertão"
Recordo
que ao tomar posse na Academia Brasileira de Letras, Ariano Suassuna discursou:
“Euclides da Cunha, mesmo ofuscado, ao se ver diante do povo brasileiro real,
pôde tomar seu lado – e o grande livro que é Os Sertões resultou do choque
experimentado ante aquele Brasil brutal, mas verdadeiro, que ele via pela
primeira vez em Canudos e que amou com seu sangue e seu coração, se bem que
nunca o tenha compreendido inteiramente com sua cabeça, meio deformada pela
falsa ciência européia que o Brasil venerava, e ainda venera, como dogma.”
Bruno Paulino, Manoel Severo e Anapuena Ravena
Apaixonado
pela saga do beato Antônio Conselheiro, Ariano dedicou-lhe o Romance d’A Pedra
do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta e andava pelos vários cantos do
país com a relíquia de um cartucho de bala em seu bolso, artefato que foi
encontrado nos arredores do dizimado arraial de Belo Monte, e que gentilmente
um morador da atual cidade de Canudos na Bahia lhe presenteou. O escritor
exibia a cápsula durante suas palestras e falava das medonhas disparidades
entre o Brasil Real e o Brasil Oficial, citando e explorando o pensamento antes
desenvolvido por Machado de Assis. Dizia que bastava estudar sobre Canudos para
entender toda história do Brasil.
“Em
Canudos, a bandeira dos seguidores de Antônio Conselheiro era a do Divino
Espírito Santo – a bandeira do nosso povo, pobre, negro, índio, e mestiço. Povo
que o Brasil Oficial, o dos brancos e poderosos, mais uma vez (e como já se
sucedera em Palmares e no Contestado), iria esmagar e sufocar, confrontando-se
ali, no caso, duas visões opostas de justiça”, escreveu certa vez Suassuna ao
inaugurar no Recife um teatro que nominou de Arraial em homenagem aos
seguidores do Beato nascido em Quixeramobim. Nem
sei por qual motivo hoje dei para lembrar esse dia. Porém, nunca esquecerei uma
frase que disse pessoalmente a mim quando tive a oportunidade de trocar algumas
palavras com ele:
“Tenho muita inveja de você rapaz que nasceu nessa terra que
pariu um dos maiores revolucionários que esse mundo conheceu que foi o bom
peregrino Antônio Conselheiro. Cuide com seus amigos para que essa história não
caia no esquecimento por aqui.”.
Disse
isso me deixando atordoado e sem saber o que responder naquele momento.
Bruno Paulino é cronista e
aprendiz de poeta
Quixeramobim,
Ceara
Fonte:blogs.opovo.com.br
E Vem aí...
Cariri Cangaço
Antônio, O Conselheiro do Brasil
Quixeramobim - Maio de 2019
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