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"O Acaso é o Deus dos Tolos" Por: Carlos Elydio Corrêa de Araújo

Antônio Amaury Correa de Araújo

Recordo nitidamente o dia em que o pai me convidou a acompanhá-lo em um evento que viria a acontecer no Juazeiro do Norte - CE, nos idos de 2009. Na época, ele começava a pagar os tributos que o Tempo impõe e eu, que então começava a segui-lo em suas jornadas, criei expectativas, empolgado em rever o cenário que marcara meus olhos de criança durante a mais longa viagem que fizemos em família em 1976. Tantas recordações queridas me assaltaram naquele momento, que num átimo respondi que sim. 

Veio à memória a cidade do Crato, o agradável "Oasis do Sertão"  e sua situação privilegiada junto ao pé da Chapada do Araripe. A bucólica cidade de Barbalha, com sua colina encimada por belos edifícios históricos, os jardins da casa de doutor Napoleão Tavares, e as fantásticas águas do Balneário, onde eventualmente os cangaceiros descansaram, e nós também. Me veio ao coração a presença de minha avó Ditinha e minha tia avó Neusa; ambas admiráveis contadoras das histórias de nossa família e dos causos que acompanharam sua saga desde os anos de 1800, sempre tão bem temperadas pelo refinamento dos caipiras. Meu tio Baptista já havia nos apresentado a Terra da Felicidade, a Salvador de então, cheia das reminiscências de seu avô, Rui Barbosa e onde havíamos reencontrado Dadá que, anos antes, convivera conosco em nossa casa. 

Antônio Amaury e as fortes ligações com o Cariri Cangaço

Aí, em meio a essas paisagens tão cheias de contrastes, no próprio Juazeiro, embalado que estava pelas conversas dos adultos, apaixonados por esse país tão belo e rico, eu conheci a alma sertaneja, plena de devoção e resiliência. Onde pude conhecer esse monumento à fé sertaneja; o Padre Cìcero. A subida para o Horto ficou gravada na minha memória com aquela multidão de beatos e penitentes, repleto de pedintes e necessitados. Impressionante o rosto famélico de então. 

Não sabia que naquele 2009, começaria uma jornada guiada por Manoel Severo, zeloso curador do "Cariri Cangaço". Um evento que já nasceu grandioso, tanto pelo cenário, palco de marcantes momentos de nossa história, quanto pela  presença de pesquisadores, historiadores e aficionados pelas temáticas do cangaço, messianismo e cultura nordestina.

Pude rever então a exuberância que tomava conta do sertão, apagando parte do passado sofrido e miserável que havia testemunhado nos anos de chumbo. Vi um evento festivo robustecendo as memórias e o conhecimento de fatos que deram contornos à nossa sociedade. 

Carlos Elydio e Antônio Amaury em uma das agendas Cariri Cangaço

O pai,  dentre tantos grandes que ali estavam, notadamente era festejado, e tido como um farol. Despertando admiração e discussões que sempre resultavam em debates, que por si só já eram sempre longos, intensos e tidos e guardados como extremamente valiosos. Era riqueza para todos. As pessoas o rodeavam e reclamavam sua atenção onde quer que passasse. E ele, solicito e atento, conforme podia ia satisfazendo as demandas. Ele tinha orgulho disso, e confessava seu desejo de que eu herdasse esse seu legado. 

Confidenciava comigo; “Sabe quem é esse senhor? Sabe quem é aquela pessoa?” comentando sobre os grandes nomes que encontrava, da gente graúda e bem colocada na sociedade, bem como o povo comum e  até alguns remanescentes do cangaço. Dizia “Isso tudo, o que me permitiu tantas e boas relações, foi o Cangaço”.

"Doutor Amaury sempre teve muito carinho e atenção com o Cariri Cangaço, seu entusiasmo era contagiante, chegávamos a ver seu olho brilhar a cada agenda, a cada visita, a cada encontro. Tê-lo conosco nesse último adeus foi um dos maiores presentes que poderíamos receber"
Manoel Severo - Curador do Cariri Cangaço

Quando, agora em 2022 compareço ao Cariri Cangaço, trazendo em meu colo  suas cinzas um ano e meio após seu passamento, me vi impactado com comparações involuntárias e inevitáveis nessa nova dimensão de espaço e tempo, pensamentos ternos e outros tantos dolorosos. Lembranças dos tempos em que ele me apresentava o mundo; seguindo sua perspectiva tão humana e sensível, e imagens dos últimos três anos; limitado que estava pela  decadência física, quando passei a carrega-lo nos braços.

Carlos Elydio, Archimedes Marques, Manoel Severo, Elane Marques e Aninha

Cheguei em Piranhas com o querido casal Archimedes e Elane Marques, e a afável Aninha. Dai em diante os sentimentos se impuseram. Sem que tivéssemos combinado, encontramos Severo em nossa primeira parada. Foi a chave das emoções. Quando Celsinho e Jaqueline Rodrigues me abraçaram, irmanados em nossas perdas, desatei em lágrimas intermitentes. E assim seguiu a cada rosto amigo que se aproximava. E era um carinho na alma e uma jornada para o passado que insistia em se fazer presente, que tudo se traduzia em gratidão à vida. Celinha de Quirino, junto com o amigo Kydelmir Dantas, quando apresentaram-me o cordel biográfico, uma homenagem que, por ser didática e carregada de emoções, me deixaram sem palavras. Ao ler, conclui que o pai estava em "boas linhas" nesse memorial. O sorriso luminoso dessa mulher não resistiu à densidade do momento. Ela também chorou o pranto dos gratos. E a família adotada, de Dr. Leandro Cardoso e Dra. Raissa, irmãos que conosco conviveram por dez anos, foram meu apoio emocional na distância da família carnal. Não tinha como ser diferente.

Pouco antes de embarcar para o porto de Angico, o companheiro cordelista Jurivaldo Alves, até então por mim desconhecido, entregou-me uma missiva pesarosa de Franklin Maxado. Meu peito transbordou de emoção ao ver o eloquente e animado amigo que, insistiu, junto com o cordelista e animador cultural Zacarias José dos Santos, já falecido, para que o pai escrevesse e expusesse  tudo que havia aprendido e compreendido sobre o fenômeno do cangaço. A esses dois, devemos a publicação da primeira obra de Antônio Amaury Corrêa de Araújo; “Assim Morreu Lampião” que foi base do programa televisivo Globo Aventura, da Rede Globo nos anos setenta.

Padre Agostinho, capelão do Cariri Cangaço, e as benções sobre as cinzas do Mestre

No momento em que conduzimos suas cinzas, meu marido, Rafael Ramos, também se fez presente pelos traços que desenhou na urna branca. O pai, vendo o interesse dele pela estética do cangaço, teria instigado, com gosto, mais um a entrar nessa seara. Quando se conheceram, já não tinha mais energia para tanto, mas seu legado teve esse poder. 

E ali, sentado no catamarã, com ele junto a mim, os amigos e admiradores iam se achegando e fazendo suas despedidas. Segurei-o no colo pela última vez, sobre as águas verdes do Velho Chico. Abraçando corações e terras dessa gente forte e admirável, dei por cumprida minha primeira missão com o que restava de meu pai. 
Após a solenidade, abençoada pelo padre Agostinho e acalantada pelo Ciço do Pife, interpretando "El Condor Pasa"
Doutor Amaury se une ao Velho Chico... Um Momento cheio de força, significado, admiração, respeito e lembranças...

Após a solenidade, abençoada pelo padre Agostinho e acalantada pelo Ciço do Pife, interpretando "El Condor Pasa", subimos à Grota do Angico onde pude observar os amigos Dr Leandro, Dr Ivanildo, Kyldemir e Kiko Monteiro explanando sobre o massacre de Angico “in loco”. Por vezes contestando pontos da obra de meu pai, o que confirmava assim a continuidade da vida através de seu pensamento crítico que deu um lugar digno às memórias daqueles considerados vencidos. Vendo os que beberam em suas generosas fontes de conhecimento, compreendo a magnitude do ato de oferecer oportunidade de diálogo com vozes resgatadas de seu silêncio. Só uma pessoa consciente de seu papel e de sua classe social teria essa capacidade. Mais uma vez senti, para além da multidão ali presente e respeitosamente silente, a presença do passado, nas figuras que frequentaram nossa casa anos a fio. Era Dadá, Zé Sereno, Sila, Balão, Criança, dentre tantos. 

Já no fim da trilha, paramos para o almoço à beira do rio, acompanhado por um grupo que agora tocava animados baiões e xaxados, encabeçado pelo Ciço do Pife, junto com o querido Gilmar, Pedro Poppof, Beto Patriota e Valdir Nogueira.

Festa sertaneja em memória de Antônio Amaury

Mais tarde, durante uma mesa dedicada a falar sobre Amaury, para além das pesquisas, junto do comandante Manoel Severo, Dr. Leandro e Ângelo Osmiro, tive o prazer de reencontrar o grande Vilson da Piçarra. Hoje um homem de sorriso franco e espírito leve, cumprimentou-me e, novamente me vi naquela mesma viagem em 1976, quando adentramos as terras de seu pai, Antônio da Piçarra. Os adultos conversavam na varanda da casa. O pai, com seu novo gravador, entrevistava essa personalidade histórica e as crianças estavam brincando no terreiro junto aos cabritos e galinhas. A prosa já ia avançada quando notei, para desgosto do pai, que um cabrito estava mastigando o fio do microfone. E devia estar fazendo isso há um tempo, posto que se perdeu grande parte do depoimento. Essa passagem Wilson ainda recorda sorrindo, e seu sorriso não mudou nada da memória que tenho de infância.

Nessa mesma noite de homenagens, a querida e meiga Dra. Raissa fez uma observação acerca de conversas que mantinha com minha mãe, Rene Maria Tavares de Araújo, tida e havida como grande cozinheira por todos que tiveram o privilégio de serem recebidos em nosso lar. Comentava a difícil missão que tiveram as companheiras desses apaixonados pesquisadores, e foi extraordinário ouvir sobre os bastidores dessa jornada que exigiu tanto foco, desprendimento e empenho para ser construída. Pude assim ter noção da abnegação, companheirismo e sacrifício dessas devotadas mulheres que propiciaram um ambiente saudável e tranquilo, sendo ambas trabalhadoras que, para além de suas atividades profissionais, ainda apoiavam e apoiam os companheiros na construção de suas obras. Sem elas estaríamos fadados a ignorância e à parcialidade dos registros oficiais e jornalísticos da época. 

Ângelo Osmiro, Carlos Elydio, Manoel Severo, Celsinho Rodrigues e Dr Leandro
Noite solene no Cariri Cangaço Piranhas 2022: Noite de Amaury !
Kydelmir Dantas, Carlos Elydio, Célia Maria e Quirino
Secretário de Cultura e Turismo de Piranhas, Eduardo Clemente, recebe de Carlos Elydio a "Urna" que trouxe as cinzas de Amaury para o Sertão: "É com muita honra que manteremos em nosso Museu a urna que trouxe Amaury de volta ao sertão"
Doutor Amaury: "Personalidade Eterna do Sertão"!

No domingo de despedidas; os últimos abraços, os até logo e votos de boa viagem durante o café da manhã farto da pousada O Canto. E nesse burburinho matinal, pude conversar um pouco mais com o afável casal Ricardo Beliel e Luciana Nabuco, que fizeram uma tocante apresentação de sua bem cuidada e bela publicação, “Memórias Sangradas”, durante o evento. Ricardo contou, de maneira envolvente, que havia conhecido meu pai de maneira muito similar a que me conheceu... Puxando assunto com o desconhecido sentado ao seu lado. Foi durante a posse dos novos membros da ABLAC - Academia Brasileira de Artes e Literatura do Cangaço. Cerimônia na qual fui agraciado com o apadrinhamento do notável e admirável casal Archimedes e Elane Marques, de quem testemunhei e atesto a competência, transparência e dedicação para o bom andamento dessa brilhante e promissora agremiação. Ali reencontrei após anos, por um desses acasos da vida, o cantor Sérgio Bianchi acompanhando o querido Jadilson. 

Carlos Elydio, Celsinho Rodrigues, Eduardo Clemente e Manoel Severo

A eloquência de Bezerra Irmão falando sobre o pai ficará na memória, bem como os cumprimentos sinceros de Paulo Britto e Ane Ranzan, os agradecimentos do Camilo, a filmagem do Helynho Santos, o abraço festivo do Beto Patriota, o cuidado de Luma Holanda e o encontro com Lucy e Sergio Araújo... Tudo isso eu devo a meu pai.  Lembro-me de ouvir o Dr. Leandro Cardoso dizer, numa citação, cuja autoria desconheço: “O acaso é o Deus dos tolos”. E de fato, esse Deus foi generoso para comigo, providenciando esses encontros em torno da herança cangaceira.

E é assim que vejo essa história de rusgas e contendas, marcada pelo sangue e pela discórdia, ser transformada num catalisador de reflexões, estudos, composições musicais, danças, performances, literatura, artesanato e turismo. De uma pujança que impressiona a tantos quantos se aventuram por esses reinos da nobreza sertaneja, tão admirada e louvada pelo homenageado, especialmente por conta do caráter, honradez, coragem, bravura e lealdade presente na cultura desses fidalgos de alpercatas e gibões, que atualmente tem abrigo nos encontros desse "Cariri Cangaço". Encontros que, para mim, permitem tangenciar a imortalidade de meu pai através de tantos irmãos em conhecimento, apaixonados por esse universo fantástico. 

Perdão por ser prolixo...  Essa experiência foi uma torrente de saberes, sabores e afetos!  Ainda acho que falei pouco. Mas tenho de dizer algo mais e agradecer ao mentor dessa experiência, que permitiu que esse processo todo fluísse com respeito, beleza e brilho que teve, Manoel Severo, a quem, em nome de minha família, agradeço do fundo de meu coração! 

Carlos Elydio Corrêa de Araújo, psicólogo, pesquisador
04 de setembro de 2022 São Paulo, SP

Cariri Cangaço Piranhas, aconteceu na cidade de Piranhas, sertão de Alagoas no baixo São Francisco, no Nordeste do Brasil, entre os dias 28 e 31 de julho de 2022; no dia 30, solenemente, as 9h30 as cinzas do Mestre Antônio Amaury eram depositadas no leito do Velho Chico e assim, seguiu ... para mais uma extraordinária jornada, avante Amaury, sempre !!!

Cinzas de Antônio Amaury Depositadas no Leito do Velho Chico , o Último Adeus no Cariri Cangaço Piranhas 2022

Dia Histórico: João de Sousa Lima, Carlos Elydio, Manoel Severo... 
e o ultimo adeus a Antônio Amaury no Cariri Cangaço Piranhas 2022

Quis o destino que o último adeus ao grande pesquisador e escritor do cangaço, Antônio Amaury Correa de Araújo, tivesse como palco o seu amado sertão, como cenário o território abençoado das caatingas nordestinas e como principal protagonista as águas caudalosas do Velho Chico. Eram cerca de 9 horas e 30 minutos da manhã do dia 30 de julho do ano da graça de 2022,  quando o universo Cariri Cangaço testemunhou ; entre as margens sergipanas e alagoanas do Rio São Francisco; o momento solene quando Carlos Elydio; filho de Amaury; ao lado de Manoel Severo, curador do Cariri Cangaço e de representantes dos mais destacados grupos de estudos do cangaço do Brasil; depositou as cinzas do gigante imortal paulista de alma nordestina, no leito do rio que ele tanto amou... Mais de 300 pesquisadores deram seu último adeus a Antônio Amaury numa manhã histórica e memorável.

Antônio Amaury, em essência, recebe o último adeus do sertão que ele tanto amou...
Momento histórico e memorável... Parte Antônio Amaury para mais uma extraordinária jornada nas caudalosos aguas do Velho Chico.
Manoel Severo exalta a memória de Antônio Amaury, Carlos Elydio deposita respeitosamente as cinzas de seu pai no leito do rio São Francisco.


O Mestre...

Amaury Corrêa de Araújo nasceu em 22 e de novembro de 1934 na cidade de Boa Esperança do Sul - SP, filho de Elydio Corrêa de Araújo e Benedicta Abib Araújo. Teve sua formação acadêmica em Belas Artes e Odontologia na cidade de Araraquara, onde também se casou no ano de 1961 com dona Rene Maria Tavares de Araújo. Mudou-se para São Paulo, onde teve os filhos Antônio Amaury, Carlos Elydio e Sérgia Rene (que viria a lhe dar dois netos, Henrique e Marcelo). Em São Paulo exerceu a profissão de cirurgião dentista tanto no consultório particular como chefiando as equipes de dentista de alguns sindicatos (Congas, construção civil e condições de veículos do transporte público de São Paulo). Produziu farto material sobre seus estudos, publicados em mais de 14 livros, cordéis, filme, documentários, ora como autor, ora como consultor. Proferiu um incontável número de palestras, sendo um incentivador de todos aqueles que manifestassem interesses nessa seara. Morreu aos 86 anos nessa mesma cidade de São Paulo, sendo reconhecidamente um dos maiores pesquisadores da historiografia do cangaço, tendo produzido um incomensurável número de entrevistas com as fontes primárias dessa saga.

"Mestre, segundo o "Aurélio" significa: Professor de grande saber e nomeada, o que é versado em qualquer ciência ou arte, oficial graduado de qualquer profissão... Para mim, Mestre é tudo isso e mais: É aquele que coloca a alma, o coração e todos os seus talentos e esforços, naquilo em que acredita, naquilo pelo qual tem paixão, naquilo que faz o "olho brilhar". Abraços, cumprimentos, como vai esse ou aquele...o tempo está assim, aliás: assado... Os amigos , o governo, os transportes, as manifestações da praça da república, e... "Cangaço"! Pronto, os olhos daquele espetacular paulista de alma sertaneja começaram a brilhar; sem dúvidas, estava diante do Mestre."
Manoel Severo, curador do Cariri Cangaço, durante um de seus últimos encontros com Antônio Amaury, em São Paulo em Setembro de 2015.

Cataramarã Delmiro Gouveia conduz doutor Amaury para mais uma jornada...

A Razão...

Quando se estava construindo a agenda Cariri Cangaço para o ano de 2022, estabelecidas as sedes onde iriam ser realizados os eventos presenciais pós pandemia; Paulo Afonso, Piranhas e Serra Talhada; surgiu a imperiosa necessidade de homenagear o pesquisador e escritor Antônio Amaury Corrêa de Araújo, falecido ainda em 26 de fevereiro de 2021. Dessa forma, Manoel Severo, curador do Cariri Cangaço, entrou em contato a família, através de Carlos Elydio, filho de Amaury, para compartilhar o desejo do Cariri Cangaço e confirmar a agenda em que seria prestada a justíssima homenagem, foi quando Carlos Elydio confidenciou o desejo de que as cinzas de seu pai, fossem depositadas no território amado por ele e no qual passou boa parte de sua vida: O sertão do nordeste, a região  do baixo São Francisco, o leito do Velho Chico.

João de Sousa Lima, Carlos Elydio, Manoel Severo, Jacqueline e Celsinho Rodrigues
Manoel Severo, Jacqueline e Celsinho Rodrigues, Kydelmir Dantas, Leandro Cardoso, 
Padre Agostinho e Narciso Dias
Padre Agostinho e as Bênçãos sacerdotais
Carlos Elydio, guardião das cinzas e da memória do pai...

"A emoção diante da revelação nos encheu de entusiasmo por ter a oportunidade de junto à família e a tantos amigos de tantos rincões brasileiros; admiradores do doutor Amaury, de seu trabalho e de sua paixão e entrega pelo tema cangaço; testemunharmos esse momento histórico e memorável para a historiografia do cangaço: depositar as cinzas do doutor Amaury no leito do rio São Francisco, ainda por cima, dentro de uma programação do Cariri Cangaço, empreendimento que ele, doutor Amaury, era um verdadeiro entusiasta desde seu primeiro momento. E assim logo a Comissão Organizadora do Cariri Cangaço Piranhas, tendo a frente nosso Conselheiro Celsinho Rodrigues, começou a preparar todas as providências logísticas para concretizarmos o sonho, e o dia chegou, eram por entre nove e nove e meia da manhã do sábado, 30 de julho de 2022, quando solenemente, Carlos Elydio, tendo como testemunhas, mais de 300 convidados, depositava as cinzas do Mestre no velho Chico" fala um emocionado Manoel Severo.   

"Quando Severo me falou que iríamos realizar esse momento extraordinário das cinzas do Dr Amaury aqui no Cariri Cangaço Piranhas, com muita alegria e honra, imediatamente  começamos a nos movimentar para planejar a melhor forma de prestar essa última homenagem, pensamos em cada detalhe para que tudo pudesse correr bem e daí com a ajuda de Severo e do Conselho; com Dr Leandro Cardoso, Ângelo Osmiro, como também o Luiz Ruben; que não pôde comparecer; fizemos uma agenda completa de homenagem ao grande pesquisador, com conferências sobre sua vida, sua obra, as repercussões, enfim, além da Comenda de "Personalidade Eterna do Sertão" entregue nessa mesma noite pelos representantes dos Grupos de Estudos;  dali nasceu a agenda em homenagem ao Dr Amaury no Cariri Cangaço Piranhas" afirma o Conselheiro Celsinho Rodrigues.

Espaço Angico
Convidados às margens do velho Chico
Homenagem e o último adeus a Antônio Amaury

O Último Adeus...

Sábado, dia 30 de julho de 2022, com o sol já se posicionando como principal testemunha do que iria ocorrer, o horário marcado para a concentração e saída do Catamarã Delmiro Gouveia; uma cortesia da MFTur; do porto de Piranhas rumo ao momento onde teríamos o ato solene das cinzas, foi de 8 da manhã. Pouco a pouco pesquisadores, admiradores, convidados de todo o Brasil que lotavam a cidade de Piranhas, começaram a chegar. Perto das 9 da manha partiram o Catamarã com lotação esgotada e mais outras embarcações para atenderem ao grande público presente.

As Bênçãos por Padre Agostinho, tendo o sertão por testemunha...
Carlos Elydio depositas as cinzas do pai no leito do rio São Francisco
As cinzas de Antônio Amaury são acolhidas pelas águas do rio São Francisco 
e se tornam um

Exatamente no ponto estabelecido de partida para a Trilha do Angico, a embarcação atracou, os convidados e demais participantes foram convidados a desembarcar e acompanhar o momento histórico e solene das margens do rio. De nosso lado esquerdo o estado das Alagoas, do direito, o estado de Sergipe, e daí sob as orientações do curador do Cariri Cangaço, Manoel Severo, as bênçãos de Padre Agostinho, as presenças dos representantes da SBEC, Leandro Cardoso; do GECC, Ângelo Osmiro, do GPEC, Narciso Dias, o protagonismo principal de seu filho, Carlos Elydio e o testemunho de centenas de admiradores, as cinzas de Antônio Amaury Correa de Araújo foram recebidas pelas águas da integração nacional, ali, sob o aplauso de uma legião de fãs; o rio e Amaury se tornaram um... 

 Doutor Amaury permanece entre nós...

"No primeiro momento efetivamente sozinho após as tocantes homenagens ao meu pai Antônio Amaury, estava contemplando o Baixo São Francisco e evocando memórias de sua obra. Evocava as primeiras e fortes impressões acerca de Piranhas e Delmiro Gouveia passadas pelo documentário que deu início ao Globo Repórter, “O Último Dia de Lampião”, baseado no seu primeiro livro “Assim Morreu Lampião” tomaram a criança de 10 anos pela curiosidade e deslumbramento quando sou trazido ao presente, olhando na direção da grota do Angico, sobre o Velho Chico, um carcará que sobrevoava solitário, destacando-se no cenário. As primeiras palavras que pude ler de seus trabalhos, quando ele convida os leitores a se imaginarem um carcará sobrevoando esse mesmo lugar, vieram a mim com aquela sua voz calma, incisiva que convidava a todos a escutarem com interesse tudo quanto dizia. E nesse momento em que nos deparamos com os mistérios da vida e da morte, tive a visceral sensação de sua presença e sua benção na figura daquele ave altaneira. Não tenho como traduzir a profundidade desse momento e creio mesmo que só compreenderei isso ao longo dos anos vindouros. Que eu tenha competência e capacidade para cuidar e dar continuidade ao seu legado" Carlos Elydio...

Festa do Cariri Cangaço nas despedidas a Antônio Amaury
Flávio, Washington, Fábio Villa, João de Sousa e Kiko  Monteiro
Caravana de Paranatama
Gilmar Teixeira, Ciço do Pife e Pedro Popoff
Jacielma Silva e Louro Teles
Damata Costa, João e Arusha Kelly

"Testemunhamos nesta manhã, aqui no Cariri Cangaço Piranhas , a maior de todas as homenagens ao grande pesquisador e escritor Antônio Amaury, um dia histórico com um momento inesquecível que a todos emocionou, nos resta a lembrança do grande pesquisador e amigo que por tanto tempo esteve ao nosso lado nas veredas das pesquisas do cangaço" revela o Conselheiro Cariri Cangaço, João de Sousa Lima.

"É como Severo falou, é o encontro da essência do doutor Amaury com a terra e o rio que ele tanto amou, sem dúvidas ver tantos amigos, de todos os lugares do Brasil, admiradores, pesquisadores, escritores respeitados compartilhando esse momento ao lado do Carlos Elydio, foi muito emocionante" , diz Luma Holanda, pesquisadora e escritora, Conselheira do Cariri Cangaço.

Cariri Cangaço, Território de Grandes Encontros
Ângelo Osmiro e Carlos Elydio
Marcus Vinicius, Beto Patriota, Jorge Figueiredo, Carlos Elydio, Luma Holanda, 
Célia Maria e José Alcântara
Vilson da Piçarra, Luiz Ferraz, Antônio Lima, Joaquim Pereira, Clênio Novaes, 
Ricardo Beliel, Luiz Antônio e Julierme Wanderley
Sertão Nordestino, Conselheiro Jorge Figueiredo
Ivanildo Silveira, Luma Holanda, Ciço do Pife e Ricardo Beliel

"Não temos palavras para traduzir essa manhã do Cariri Cangaço Piranhas. Essa homenagem à memória do doutor Amaury, a presença de seu filho, nosso amigo Carlos Elydio, toda a solenidade das cinzas no São Francisco, memorável. Doutor Amaury lá do céu com certeza esta muito feliz por reencontrar o chão e as águas do nosso sertão" fala o Conselheiro Cariri Cangaço Ivanildo Silveira.

"Nós que fazemos o Conselho do Cariri Cangaço e eu particularmente também representando o GPEC - Grupo Paraibano de Estudos do Cangaço, nos sentimos honrados por participarmos desse momento histórico. Acho que nunca houve uma concentração tão grande de pesquisadores e escritores de temas nordestinos como nesse Cariri Cangaço e em especial nesse momento aqui às margens do velho Chico. Todos guardarão na memória e poderão dizer a seus netos que estavam aqui no dia de hoje" confessa Narciso Dias, presidente do GPEC.

"A homenagem de meu companheiro Rafael Ramos ao meu pai"
diz Carlos Elydio sobre a Urna que acolheu as cinzas de Antônio Amaury.

A urna que serviu de depósito às cinzas de Antônio Amaury foi entregue por Carlos Elydio na noite do dia 30 de julho, ao secretário de cultura da cidade de Piranhas-AL, Eduardo Clemente, para que fique exposta
no Museu do Sertão.

João de Sousa Lima e Manoel Severo
Nerizângela Silva
O último adeus...
João de Sousa Lima, Celsinho Rodrigues e Fabio Villa

"...Aqui na “Lapinha do Sertão”, a graciosa cidade de Piranhas -AL, o epicentro da derrocada do cangaço, paraíso natural do Baixo São Francisco, terra de bons encontros e da última viagem que fiz com meu pai. Nesse pouso fui recebido tão acolhedoramente, de braços abertos pelo querido Celsinho Rodrigues e sua amabilíssima mãe Jaqueline que, juntamente com o grande curador do Cariri Cangaço, Manoel Severo, que me possibilitaram realizar a missão de entregar as cinzas do maior e mais longevo pesquisador da historiografia do cangaço nas águas do Rio da Integração Nacional, junto ao pequeno porto da fazenda Angicos -Poço Redondo. Um rio que, como ele, veio do Sudeste fertilizando a cultura sertaneja com seus estudos aprofundado por essa paixão que mobilizou sua Vida. Ele, que foi titulado, merecidamente, como cidadão piranhense, agora flui, como seus livros e suas memórias no coração e ensinamentos que tantos indivíduos brilhantes agregou ao seu redor. Sua generosidade, desprendimento e entusiasmo proporcionaram a mim receber, em seu nome, uma enxurrada de gratidão, reconhecimento, carinho e admiração de tantos quantos foram tocados pela sua existência verdadeiramente significativa. Pude, finalmente, junto de seus muitos amigos e admiradores chorar a sua morte para essa vida e festejar seu renascimento para a imortalidade daqueles que, não sendo egoístas e mesquinhos, compartilham seus conhecimentos e aprendizados com o povo" testemunha Carlos Elydio.

Conselheiro Cariri Cangaço Pedro Popoff; 
com 16 anos, o mais jovem conselheiro do Cariri Cangaço
Dantas Suassuna
Gilmar Teixeira, Carlos Elydio e Luma Holanda
Valdir Nogueira, Dantas Suassuna, Leandro Cardoso e Kydelmir Dantas

O Conselheiro Cariri Cangaço, Leandro Fernandes, sobre a partida de doutor Amaury: "Lembrei-me do verso de Fernando Pessoa: “A morte é só a curva da estrada/Morrer é não ser visto”. A construção da nossa eternidade começa aqui e agora, e só sucumbe à morte os que se dão ao esquecimento. Morrer é ser esquecido. Disse em versos Francisco Otaviano: “quem passou pela vida em branca nuvem/e em plácido repouso adormeceu/(...) foi espectro de homem, não foi homem/ só passou pela vida e não viveu”. E nesse ponto, meus amigos, confrades e confreiras, Antônio Amaury foi exemplar. Viveu plenamente um sonho profícuo, com extensa frutificação, cujas sementes foram espalhadas pelos bons ventos da arte, da beleza e do conhecimento."

Odilon Nogueira e Conselheiro Bismarck Oliveira
Conselheiro Jair Tavares e Mestre Folheteiro Jurivaldo
Cariri Cangaço e a Alma Nordestina no ultimo adeus a Antônio Amaury

"Paulista, Antônio Amaury, é um dos maiores pesquisadores da vida de Lampião e da história do cangaço, há mais de 60 anos em busca de informações sobre o assunto realizou muitas entrevistas (com pessoas da sociedade, do cangaço e das forças policiais da época e familiares remanescentes). Suas pesquisas minuciosas, diretas, imparciais, fazem-no um autêntico mestre, criterioso e honesto. Nos anos 70, tornou-se conhecido em todo o Brasil ao participar do "Programa 8 ou 800", da TV Globo, respondendo sobre o assunto. Tem vários livros publicados sobre o assunto, entre eles: “Lampião: Segredos e Confidências do Tempo do Cangaço”; “Assim Morreu Lampião”; “Lampião: As Mulheres e o Cangaço”; “Gente de Lampião: Dada e Corisco”; “Gente de Lampião: Sila e Zé Sereno”; “De Virgolino a Lampião”; “O Espinho do Quipá” (estes dois últimos em co-autoria com Vera Ferreira, neta de Lampião); “Lampião e Maria Fumaça” (co-autoria com Luiz Ruben F. de A. Bonfim, de Paulo Afonso – BA); “A Medicina e o Cangaço” (em co-autoria com Leandro Cardoso Fernandes, de Teresina – PI). Seu trabalho mais recente é “Lampião e as Cabeças Cortadas”, também em co-autoria com Luiz Rubem Bonfim. É também Sócio-fundador da União Nacional de Estudos Históricos e Sociais – UNEHS.

Célia Maria e Conselheiros Cariri Cangaço-GPEC: Quirino, Narciso Dias, Bismarck Oliveira, João de Sousa Lima, Luma Holanda e Emmanuel Arruda
Carlos Elydio e Narciso Dias
Conselheiro Cariri Cangaço Leandro Cardoso

"Doutor Amaury possuía fortes ligações com o Cariri Cangaço, desde o nosso começo, desde de nossa primeira edição ainda no ano de 2009 como um de nossos principais incentivadores e apoiadores, sendo figura principal dentre todos os ilustres convidados deste que já se prenunciava como um dos maiores eventos já realizados sobre a temática cangaço. Ao longo de todos esses anos de Cariri Cangaço, tivemos sempre a honra e o grande privilégio de contar com o Mestre Antônio Amaury ao lado de seu filho Carlos Elydio em incontáveis de nossas agendas, sendo referência na pesquisa e estudo da temática cangaço, tê-lo na família Cariri Cangaço sempre foi uma enorme honra coroada hoje com essa maravilhosa despedida, reunindo incontáveis amigos de todo o Brasil, no chão que ele aprendeu a amar e dentro de uma programação do Cariri Cangaço, sem palavras..." revela Manoel Severo, curador do Cariri Cangaço.

Momento de Homenagem ao pesquisador Antônio Amaury Corrêa de Araújo, solenidade de entrega de suas cinzas ao leito do Rio São Francisco. 
Margens, Sergipana e Alagoana, 30 de julho de 2022 Piranhas - Alagoas - Nordeste do Brasil.

Fotos: Louro Teles, Ricardo Beliel, Heldemar Garcia e Helinho Santos