Missão Velha e o Fogo da Rua do Trilho de Ferro Por: Bosco André

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Estação de Missão Velha

O dia 15 de março de 1926 em Missão Velha, foi marcado pelas mortes do Tenente Fernando Porto e do Sargento José Pereira do Nascimento, que desencadearia grande perseguição a Zé Gonçalves e seus homens, todos ligados a Izaias Arruda. O tiroteio aconteceu na Rua Trilho de Ferro, nas proximidades da atual Estação Ferroviária, mais precisamente, no hoje cruzamento da Rua Trilho de Ferro com a Rua São Francisco. No fogo se envolveram pessoas ligadas diretamente ao Cel. Izaias Arruda; como Júnior Arruda, seu irmão, José Pereira de Figueiredo, seu primo e mais os cangaceiros do seu grupo: Manoel Salgueiro, Raimundo Gomes dos Santos, seu parente e cunhado de Zé Gonçalves, Raimundo Budú, Doca Chufer, Ferrugem, primo de Zé Gonçalves e mais tarde integrante do Bando de Lampião, João Serra, Agripino, Pela Onça, João Pedro e Paulo Gomes de Matos; conforme Inquérito Policial conclusivo datado de 04 de maio de 1926, presidido pelo Major Álvaro Weyne – Delegado de Polícia de Fortaleza, que veio a Missão Velha, especialmente para este procedimento investigativo..

No tocante as mortes do Tenente Porto e do Sargento Zé Pereira, acima referidas, o Sr. José Gonçalves de Lucena, esteve sempre na linha de frente, mais muito estrategista não aparecia nas crônicas policiais, assim, contou-me, que no mês de abril de 1926, numa tarde nublada, notou a presença de pessoas desconhecidas na Cidade, corria a investigação sobre o crime acontecido no dia 15 de março pretérito.

O Cel. Izaias, estava viajando, então contatou com todos os companheiros (os cangaceiros de Izaias), que deveriam ao anoitecer apanharem as suas armas em casa de Antonio Brasileiro, pois as armas ficavam em lugar diferente do que se esperava, que deveria ser na casa de Izaias, segundo ele, a casa de Brasileiro, ficava guarnecida por matapastos, arbusto de pequeno porte; então foram apanhar as armas à hora marcada, rastejando como cobra por dentro do matapasto.

Todos armados e bem municiados, quando por volta das 21 horas, a polícia abriu fogo contra a casa de Zé Gonçalves, recém casado, que morava na antiga Rua do Brejo, hoje Dom Carloto, más aquela altura dos acontecimentos, Zé Gonçalves já havia retirado a sua esposa para a casa do seu sogro Bernardino Gomes dos Santos. Zé Gonçalves e os cangaceiros, se encontravam dentro do brejo em frente a casa alvo do tiroteio da polícia e aí eles também abriram fogo contra a policia e se refugiaram no Sítio Poções, na encosta da Serra do Mãozinha, onde passaram a se alimentar com milho verde cru, pois sabiam da notícia de que a policia estava em seus encalces e não podiam dar o menor sinal dos seus paradeiros, não podendo sequer acender um fogo para fazer os seus alimentos, passados uns oito dias nos Poções, Júnior Arruda, disse que não agüentava mais aquela vida, tendo Zé Gonçalves, lhe dito: “nós estamos aqui por sua culpa” e combinaram irem para o Sítio Barreiras de Missão Nova, onde morava Antonio Arruda, irmão mais velho do Cel. Izaias e ali chegaram ainda pela madrugada. Zé Gonçalves ficou recolhido dentro do mato, enquanto os demais cangaceiros foram para a casa de Antonio Arruda, a procura do que comer. Pois segundo a notícia corrente, era que a ordem que viera de Fortaleza, era para levar a cabeça de Zé Gonçalves, líder e mentor do grupo de Izaias.

Passado o dia nas Barreiras, sem maiores vexames e Zé Gonçalves, sempre recolhido ao mato, para onde foram mandados fartos pratos para a sua alimentação e segundo o próprio Zé Gonçalves, “a noite com uma saudade danada de Dona Senhora (sua mulher), subiu até a casa do fazendeiro conhecido por Dezembro, nas Barreiras de Cima e ali comprou uma vaca para ser abatida por seu pai Joaquim Gonçalves de Lucena (pai de Zé Gonçalves) (que era magarefe em Missão Velha), rumando à cidade, tangendo a vaca e o mosquetão de lado, ao chegar próximo a cidade, deixou a vaca num curral de propriedade do Sr. Pedro Rocha e seguiu seu destino, ao se aproximar da entrada de Missão Velha, notou um converseiro e achou que era a polícia, então desviou a sua rota e saiu por dentro do brejo e daí para a casa do seu sogro, onde se encontrava a sua mulher.

Zé Gonçalves, homem de confiança de Izaias Arruda

Por traz da casa do Sr. Bernardino, morava um soldado de nome Zé Pereira e Zé Gonçalves, achava que podia confiar, viu de dentro do mato que Zé Pereira estava no meio da sala, sentado ao chão, comendo alguma coisa, eram mais ou menos meia noite e na sala uma lamparina acesa, dando a sua luminosidade para os matos, pois aquela época Missão Velha era da atual Rua Rosalvo Maia para a Rua da Várzea. Zé Gonçalves, contra a luz do candieiro pulou como um gato, dentro da casa do Soldado Zé Pereira, e, este, pegando o seu rifle, viu que era Zé Gonçalves e lhe advertiu, vá embora, pois a sede da polícia é em você! Zé Gonçalves, fazendo ouvido de mercador, pediu para entrar pelo seu quintal para a casa do seu sogro, que ficava nos fundos. Ao amanhecer do dia, o Sr. Bernardino, saindo à rua, voltou imediatamente e avisou a Zé Gonçalves, que a policia já sabia que ele estava em sua casa. Nesta época, estavam sendo feitos os trabalhos para levar a estrada de ferro a Juazeiro e ao lado da casa do Sr. Bernardino, estava os montes de aterro, enquanto do outro lado do aterro ficava uma Bodega do Canjica, isto nas imediações da casa do Sr. Zé Martins e os soldados iam na bodega do Canjica e vinham para cima do aterro, olhando para a casa onde estava Zé Gonçalves, numa demonstração patente de que o soldado Zé Pereira, havia traído a confiança de Zé Gonçalves.

O Sr. Bernardino, era compadre do Padre Cícero e imediatamente, fez uma carta apresentando Zé Gonçalves como seu genro e contando toda a situação vexatória do momento. Mandou celar um bom animal e colocou à frente da porta da sua casa, tendo Zé Gonçalves, fazendo mais uma vez o papel de um gato ligeiro, pulado em cima do cavalo e seguido para Juazeiro, ao passar na Bodega do Jacobina, na Rua da Várzea, onde existiam duas palmeiras à porta, até pouco tempo ainda existentes, estavam ali postados outros soldados da força que veio de Fortaleza, Zé Gonçalves, passando o Rio Missão Velha em direção a Juazeiro, ouviu quando alguém disse, ali é Zé Gonçalves. Ao alcançar a Carnaúba, o cavalo já muito cansado e suado, esteve com Quinco Vasques em sua casa, que se oferecera que Zé Gonçalves, podia ficar ali, pois nem mosquito lhe mordia, más Zé Gonçalves ponderou de que estava com a carta para Meu Padim Cícero e seguiu viagem. Ao chegar em Juazeiro, foi recebido pelo Padre Cícero, onde ficou hospedado por quatro dias, tendo com a interferência e prestígio do Padre velho do Juazeiro, às forças deixado Missão Velha”.


Bosco André
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13 comentários:

IVANILDO ALVES SILVEIRA disse...

QUERO PARABENIZAR O COLEGA "BOSCO ANDRE", POR MAIS ESSE FATO NARRADO, AQUI NESSE BLOG, ANTE A RIQUEZA DE DETALHES, E A CORAGEM E ESPERTEZA DO CABOCLO " ZÉ GONÇALVES " EM SUAS QUERELAS NA CIDADE DE MISSÃO VELHA.

BOSCO, GOSTARIA DE SABER, COMO FOI A MORTE DE ZÉ GONÇALVES ( NATURAL OU VIOLENTA ),E SE DE FATO, ELE ERA FILHO BASTARDO DO CORONEL SANTANA ???
Um abraço e obrigado pela atenção.

IVANILDO ALVES SILVEIRA
Colecionador do cangaço
Natal/RN

IVANILDO ALVES SILVEIRA disse...

QUERO PARABENIZAR O COLEGA "BOSCO ANDRE", POR MAIS ESSE FATO NARRADO, AQUI NESSE BLOG, ANTE A RIQUEZA DE DETALHES, E A CORAGEM E ESPERTEZA DO CABOCLO " ZÉ GONÇALVES " EM SUAS QUERELAS NA CIDADE DE MISSÃO VELHA.

BOSCO, GOSTARIA DE SABER, COMO FOI A MORTE DE ZÉ GONÇALVES ( NATURAL OU VIOLENTA ),E SE DE FATO, ELE ERA FILHO BASTARDO DO CORONEL SANTANA ???
Um abraço e obrigado pela atenção.

IVANILDO ALVES SILVEIRA
Colecionador do cangaço
Natal/RN

Anônimo disse...

Um prosador de 1ª grandeza, como antológico têm sido todos os fatos e "causos" contados pela pena nobre deste confrade, o eminente memomrialista e pesquisador João Bosco André; meu ilustre conterrâneo.
Parabéns por mais esta bela história, que a geração do presente e do futuro não poderão dá-se ao luxo do seu esquecimento.Posto que toda história autêntica; quer seja escrita ou oral é a única maneira de nos transportar no tempo e no espaço. E, mais: a luta permanente da memória contra o fantasma do esquecimento total. Razões de sobras portanto, temos sobremaneira nós, missãvelhenses e caririenses
para renden nossas sinceras e merecidas homenagens pelo esforço audaz e tenaz do camarada Bosco André.
Com sua verve historiográfica, prestas um grande serviço a nossa terra.
Saudações Fraternas,
Prof. José Cícero
Aurora-CE.
**********
www.seculteaurora.blogspot.com
www.aurora.ce.gov.br
blogdaaurorajc.blogspot.com
www.jcaurora.blogspot.com

Anônimo disse...

Aqui vemos reunidos além do espetacular texto de João Bosco André, o comentário de dois dos mais respeitáveis personalidades do mundo da pesquisa do cangaço. Um do rio Grande do Norte, que não tive o prazer de cumprimentar ainda, senhor Ivanildo, espero ter essa satisfação esse ano no Cariri Cangaço e o outro este grande pesquisador, batalhador permanente de grande valor, o secretário de cultura de Aurora, professor José Cícero.

Parabens ao Blog do cariri cangaço por reunir tantos "montros sagrados" da memória e pesquisa.

Professor Gregório de Jesus

Anônimo disse...

MEU CARO DR. IVANILDO, MEU ABRAÇO, FAZENDO-SE ACOMPANHAR DOS MEUS AGRADECIMENTOS PELOS SEUS ENCÔMIOS AO MEU HUMILDE TRABALHO AQUI POSTADO. COM RELAÇÃO ÀS SUAS INDAÇÕES, PASSO A RESPONDER-LHE: SEU ZÉ GONÇALVES, APÓS O EPISÓDIO QUE ENVOLVEU A TRAIÇÃO DO CEL. IZAIAS ARRUDA A LAMPIÃO, EM QUE ZÉ GONÇALVES DISCORDOU DA DESLEALDADE COM AQUELE, ESTE, AFASTOU-SE DO SEU ANTIGO CHEFE, PASSANDO A TRABALHAR COMO OLEIRO E PEDREIRO. FOI QUEM CONSTRUIU O ATUAL CEMITÉRIO PAROQUIAL DE MISSÃO VELHA. DURANTE O DIA FABRICAVA OS TIJOLOS NA CACHOEIRA, TERRAS PERTENCENTES AO SEU SOGRO E A NOITE IA SENTAR TIJOLOS SOBRE A LUZ DE UMA LAMPARINA COM A AJUDA DA SUA ESPOSA, E NESTA EMPREITA GANHOU VINTE CONTOS DE RÉIS E AÍ COMEÇOU A COMPRAR TERRAS E FEZ FORTUNA, CHEGANDO A SER UM DOS MAIORES LATIFUNDIÁRIOS E CRIADOR DE MISSÃO VELHA. ERA MESMO FILHO DE JOAQUIM GONÇALVES DE LUCENA E DE DONA MARIA DA SOLEDADE DE JESUS LUCENA. TENDO SEGUIDO O EXEMPLO DO CEL. SANTANA, FORMOU TODOS OS SEUS FILHOS. MORREU COMO SE DIZ NA SUA CAMA, AO LADO DOS SEUS FAMILIARES EM FORTALEZA, COM QUASE 102 ANOS.

Anônimo disse...

AO MEU CONTERRÊNEO E AMIGO JOSÉ CICERO, DINÂMICO SECRETÁRIO DE CULTURA DE AURORA, OS MEUS MAIS PENHORADOS AGRADECIMENTOS AS SUAS REFERÊNCIAS A ESTE SEU MAIS HUMILDE ADMIRADOR. COM O ABRAÇO DO: BOSCO ANDRE.

Anônimo disse...

CONFRADE GREGÓRIO DE JESUS, PERMITA-ME ASSIM O CHAMAR, POIS PELO EMAIL AQUI POSTADO, VEMOS QUE VOCÊ É UM EXÍMIO ADMIRADOR DO CANGAÇO E AQUI AGRADEÇO AS SUAS REFERÊNCIAS ELOGIOSAS AO MEU TRABALHO E ESTAMOS NO SEU AGUARDO POR OCASIÃO DA REALIZAÇÃO DO IIº CARIRI CANGAÇO 2010. ABRAÇÃO: BOSCO ANDRÉ.

José Mendes Pereira disse...

Bosco André: A sua narrativa é maravilhosa e útil a nós, pesquisadores amadores do cangaço do nordeste. Parabéns pela boa cultura que nos entrega. José Mendes Pereira- Mossoró - Rio Grande do Norte

Professora disse...

Assim como todos vcs,sou apaixonada pela història do cangaço e por toda A CULTURA NORDESTINA ,QUE É RIQUISSIMA. PARABÈNS A VC QUE ESCREVEU TÃO BEM A RESPEITO DE UM FATO QUE JÁ QUERIA MUITO SABER.Conheci Missão Velha ,cidade belissima,a poucos meses,mas o suficiente pra amar essa terra.Amo o cariri .Sou professora de Literatura cearense .

Anônimo disse...

QUERIDO AMIGO BOSCO ANDRÉ!
MAIS UMA ESTOU AQUI NESTA PÁGINA PARA DIZER DA SUA IMPORTÃNCIA NA VIDA SOCIAL, POLITICA E CULTURAL DA NOSSA CIDADE. AMIRO!!! VOCÊ É UM HISTÓRIADOR NATO.MISSÃO VELHA PRECISAVA DE UM CARA COMO VOCÊ, PARA ESCREVER E DIVULGAR NOSSA HISTÓRIA.
COMO PROFESSOR DE HISTÓRIA VOCÊ TERÁ TODO MEU APOIO E ADMIRAÇÃO.
JOSE DANTAS DA SILVA

Unknown disse...

Muito bom teu Blog, tenho um bisavó que foi da turma de Lampião: José Bernardino Gomes, o filho dele foi Manoel Bernardino Gomes só achei um artigo e documento que cita o nome de meu bisavó já depois de morto.

Unknown disse...

Gostaria de poder ver fotografias da antiga rua da varzea nos anos 60.Nasci e me criei até os 12 anos nessa rua da minha querida missão velha.Saí de la em 1970 e nunca mais retornei.

Unknown disse...

Em que ano José Gonçalves morreu? Deveria contar cada história para seus netos...