Manoel Severo, Rangel Alves da Costa e as "Havaianas de Alcino" no
Memorial Alcino Alves Costa em Poço Redondo, Sergipe
Alcino era um apaixonado pelo sertão, pelas histórias cangaceiras, pela música caipira, pela dupla Tonico e Tinoco, pela saga sertaneja e suas múltiplas feições, mas também por alpercatas havaianas. Sandália, chinelo, alpercata, ou qualquer outra denominação que se deseje dar, a verdade é que Alcino não tirava uma dos pés.
Seu costume e apego pelas havaianas era tamanho que não tirava elas dos pés por motivo algum, abrindo exceções somente quando, na condição de prefeito municipal, recebia autoridades políticas e governamentais em eventos oficiais ou se dirigia até o palácio do governo para tratar de assuntos referentes ao município. Ainda assim num desconforto danado.
O desconforto com os sapatos era visível. Alcino só faltava mesmo levar chinelo nos bolsos e calçá-los assim que saísse dos gabinetes. Andava troncho, pisando desconforme, à moda daqueles que usam sapatos apertados demais. E certamente, mesmo que folgados ou ajustados aos pés, tornavam-se apertados demais. Seus pés estavam acostumados mesmo com a liberdade.
Professor Pereira, Manoel Severo e Alcino Alves Costa
Muitas vezes, na capital sergipana e após o uso de sapatos em reuniões oficiais, chegava da rua e ultrapassava o portão em verdadeira correria. Nada de estar apertado e precisar ir ao banheiro, nada de outra motivação para aquela pressa toda, pois simplesmente sua vontade de se desafazer daquele couro e daquelas meias e calçar suas havaianas. Depois, confortado, chegava a sorrir sentindo seus pés em liberdade.
As havaianas eram, assim, sua companheira inseparável, desde o levantar ao deitar. Fazia seu uso em quase todas as situações. Bastava se imaginar calçando sapatos e já fazia cara feia, como se já estivesse sentindo seus pés doloridos e aprisionados. Era um prefeito de havaianas, um líder político de havaianas, um eterno caminhante de havaianas.
Alcino gostava de usar calça social, mas não camisa social. Mesmo de calça assim, nos pés sempre as havaianas. Acaso alguém avistasse ao longe uma pessoa de calça social, camisa fechada (geralmente listrada), cantarolando baixinho a cada passo, e de havaianas, podia saber que se tratava de Alcino.Certamente que havia motivações para que Alcino gostasse tanto de havaianas. E tudo pode ser explicado pelo próprio amor ao sertão. Seus pés ficavam mais rentes a terra que tanto amava, seus passos ficavam mais seguros por onde fosse, a leveza no passo permitia que caminhasse muito, que incessantemente seguisse. E ter os pés sujos da poeira sertaneja significava também ter sobre si a essência daquele seu mundo.
Alcino Alves Costa em entrevista a TV Diário no Cariri Cangaço 2009
A liberdade proporcionada pelas havaianas era a liberdade que Alcino tanto procurava em cada passo da vida. Talvez nem sentisse a borracha sob a pele. Talvez simplesmente sentisse a própria terra abaixo dos pés. E neste sentido dissesse a si mesmo que caminhava descalço e que o chão sertanejo fazia parte de sua própria pele.
Tão apaixonado era pelas havaianas que sequer se importava se já estivessem totalmente desgastadas e necessitando de outras. Enquanto filho, já o vi pedindo para que colocassem alguma presilha abaixo da correia que havia quebrado. Em instantes assim, logo outra era providenciada. E com as havaianas seguia até que alguém percebesse - nunca ele - que já estava imprestável ao uso.
O Memorial Alcino Alves Costa ainda guarda um exemplar dessa paixão de Alcino. Visitantes chegam e perguntam por que aquelas chinelas ali. A resposta é sempre a de que ele gostava de usar havaianas. Mas a resposta certa é outra: “Ali a simplicidade de um homem e o seu passo quase descalço pela sua amada terra sertão!”.
Rangel Alves da Costa, Escritor
Conselheiro do Cariri Cangaço - Poço Redondo,SE
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