Este Maravilhoso Conselho ! Por:Manoel Severo

Manoel Severo curador do Cariri Cangaço

Ao longo de minha vida trilhei inúmeros caminhos; trilhas fáceis e algumas extremamente árduas, aprendi muitas vezes e a muito custo que não nos bastam apenas a boa vontade e as boas intensões. Na verdade a vida acabou me ensinando que é necessário o caminhar, o agir, a atitude, e dai transformar verdadeiros sonhos em realidade, fica fácil. Ah Vida ! Essa tal de vida... Essa verdadeira universidade cheia de tantas lições, engrandecedoras, desconcertantes, magnânimas ! A ela me entrego com todas as minhas forcas, com uma paixão e um entusiasmo que muitas vezes me assusta, me toma de assalto. Ah vida ! Quanta coisa boa, quanta Gratidão. 

Lições, e quantas lições, e ai aprendi que nada se constrói só e que a verdadeira harmonia se consolida na união equilibrada e respeitosa de elementos opostos, numa teia de talentos e força, muita força e ai... Nasceu o Cariri Cangaço. Todo o corpo possui cabeça, tronco, membros... E cérebro. Todo o movimento nasce a partir do sincronismos perfeito entre todos esses componentes, e tudo acaba acontecendo, ganhando vida, mas... o que seria dos movimentos se não fosse a vibração de seu grande mentor, o cérebro ? 

Alcino Alves Costa, o patrono do `cérebro`

Em nosso caso temos um espetacular cérebro , tao cheio de talentosos e valorosos neurônios, que fica difícil acreditar que conseguimos reunir dentro dessa humilde caixa craniana... A esse cérebro chamamos de Conselho...  E a esse Conselho estabelecemos uma Missão e a ele demos um Patrono: Alcino Alves Costa, e na tarde do ultimo dia 21 de setembro de 2013, na cidade de Barbalha, uma das anfitriãs do Cariri Cangaço realizamos a posse de seus ilustres membros.

Parece ter sido a toa a escolha da cidade de Barbalha, mas como poderia ter sido? Ali, na terra dos verdes canaviais está o primeiro, aquele a quem buscamos no primeiro de todos os momentos para irrigar todo esse cérebro , todo esse sonho, seu nome: Napoleão Tavares Neves.

Napoleão Tavares Neves

E assim o Conselho Consultivo Cariri Cangaço Alcino Alves Costa, assume novamente o desafio de pensarmos juntos os próximos passos de nosso sonho, 2014, 2015...2016. De seu berço o Ceará, tomamos emprestado na capital, Ângelo Osmiro e Aderbal Nogueira, lá do centro roubamos uma menina valente pra peste: Juliana Ischiara, descemos para nosso amado cariri e chegamos a Crato com Pedro Luiz Camelo, de Aurora veio o determinado José Cicero, do Barro, o sensacional Sousa Neto, do portal Missão Velha , reverendíssimo padre Bosco Andre, da terra de Fidera, mais uma mulher arretada, Cristina Couto que unidos ao Mestre Napoleão Tavares Neves formam a seleção alencarina do Conselho.

Teresina nos permitiu o talento de Leandro Cardoso que abriu alas para outra seleção: a potiguar, com os nomes de peso de Honório de Medeiros, Paulo Gastão, Kydelmir Dantas, Ivanildo Silveira e Múcio Procópio, haja folego !!! A Paraíba nos presenteou com Narciso Dias e os incansáveis Wescley Rodrigues, verdadeira revelação  e o  professor Pereira, Mestre dos mestres em matéria de literatura do sertão !


A terra de Virgulino nos trouxe os Pernambucanos; o volante Geraldo Ferraz e o homem das sete colinas, Antonio Vilela, alem da doce Ana Lucia Granja. Cruzando o Velho Chico a trilogia final nordestina com os Sergipanos, Kiko Monteiro o fantástico Lampião Aceso e Archimedes Marques, o alagoano da bela Piranhas, Jairo Luiz e o baiano valente que só a gota, João de Sousa Lima... 


Eita !!!! 25 conselheiros? ou seriam 25 mil ? Certamente a ordem dos fatores não altera o resultado, o fato e que esses homens e mulheres se juntam não apenas em torno de um evento, de um projeto, mas em torno de um sentimento, o sentimento de profundo amor as coisas do sertão, do nordeste, amor esse que nasce do fundo de nossa alma, por isso chegamos ate aqui. 


Parabéns Nação Cariri Cangaço e abraçando a esses queridos irmãos do Conselho, abraçamos a todos que fazem parte desta grande família espalhada por todo o Brasil; 
feliz 2014 e que venham 2015,2016,2017...


Manoel Severo - Curador do Cariri Cangaço
Fortaleza, Ceará
Incorrigível Sonhador

Momentos Inesquecíveis Por: Neli Conceição

Ana Lúcia, Lili e Wescley Rodrigues

Querido Manoel Severo , mais uma vez vivi momentos de verdadeira felicidades neste ano de 2013; sob seu comando e na companhia dos nossos amigos no inesquecível Cariri Cangaço 2013 em setembro, aí no Ceará.

 A família Cariri Cangaço está repleta de momentos indescritíveis . O Cariri Cangaço é tudo de bom é a família que tenho no nordeste.
Você sempre muito atencioso com todos e sempre com um sorriso cativante que trazemos com muitas saudades. 
Obrigada por sempre lembrar dessa sertaneja caipira. 
Sou uma saudade única .

Quero mandar meu abraço de feliz 2014 a toda família Cariri Cangaço e que muitos outros momentos possamos ter para reviver a verdadeira história de nosso amado nordeste, Grande abraço da sua admiradora .EmojiEmoji 
Lili  CangaceiraEmoji 

Neli Conceição é filha do casal de cangaceiros, Moreno e Durvinha.

Guaribas e Chico Chicote no Cariri Cangaço 2013

Guaribas na Rota Cariri Cangaço

O sol já havia se escondido por detrás da majestosa Chapada do Araripe quando a caravana Cariri Cangaço, vinda da fazenda Piçarra e do distrito de Simão, chegou na emblemática fazenda Guaribas, palco e cenário de um  dos mais sangrentos combates daquela época.

Os episódios daqueles distantes anos 20 , quando se perpetrou em Guaribas um dos mais sangrentos e covardes embates do ciclo cangaceiro, quando tombaram mortos 37 pessoas, entre cabras de Chico Chicote e soldados das volantes do Ceará, Paraíba e Pernambuco, sob o comando de José Bezerra, Arlindo Rocha e Manoel Neto, pareciam se desenvolver sob os nossos olhos, a partir dos escombros da velha casa da fazenda e das muitas testemunhas mudas do grande épico porteirense.

 Ivanildo Silveira e Juliana Ischiara em Guaribas no Cariri Cangaço 2013
Leandro Cardoso e Manoel Severo e a Roda de Conversa "Guaribas de Chico Chicote"


O lendário Chico Chicote se configurou como um dos personagens mais marcantes do cangaço no Cariri. Homem de renomada valentia e coragem, respeitado por todos e posteriormente inimigo confesso de Virgulino Ferreira acabou sendo vítima de um plano ardiloso que contou com a participação de seus principais inimigos; da família de Sinhô Salviano; que contava com a proteção do poderoso Cel. Zé Pereira de Princesa. 


Por volta das sete da manhã de 01 de fevereiro de 1927, Chico Chicote teve sua Fazenda Guaribas cercada por cerca de 150 homens sob o comando do Ten. José Gonçalves Bezerra; na tropa estavam ainda, a força de Pernambuco com Arlindo Rocha e Manuel Neto e homens de Zé Pereira, de Princesa. Conta-se que as forças de Pernambuco foram induzidas a entrar no combate pensando que combatiam Lampião.

Depois de um fogo cerrado de 31 horas de bala e com apenas Manel Caipora, Sebastião Cancão e Vicente Chicote, cai a resistência de Chico Chicote que é encontrado morto, ainda em posição de tiro. Virgulino a tudo ouviu, pois estava a pouco menos de uma légua do acontecido, mas não participou: “Se fosse amigo ia da uma retaguarda...” teria afirmado o rei dos cangaceiros.

Prefeito Manoel Novaes e Manoel Severo, a Caravana Cariri Cangaço pela primeira vez nas Guaribas em 2011. Na foto abaixo, também de 2011, vemos Antonio Amaury, Lívio Ferraz, Severo, Sousa Neto e o mestre Alcino Costa


Essa foi a segunda visita da Caravana Cariri Cangaço à fazenda Guaribas de Chico Chicote; ainda na edição de 2011, quando Porteiras se tornou cidade sede do evento, estivemos pela primeira vez naquele emblemático cenário, sendo anfitrionados pelo prefeito Manoel Novaes e Napoleão Tavares Neves e tendo contato com essa que foi umas das maiores e mais violentas sagas  do cangaço no Cariri.

Manoel Severo
Cariri Cangaço 2013

Bibliografia de Gonzaga Por:Kydelmir Dantas


Não deixando de reconhecer o trabalho da Dominique Dreyfus, sobre o Rei do Baião. Uma das biografias mais completas que conhecemos. Eis, abaixo alguns livros que foram publicados, sobre ou com citações e/ou a biografia de LUIZ GONZAGA:

DREYFUS, Dominique. Vida de viajante: a saga de Luiz Gonzaga. 2 ed. São Paulo: Editora 34, 1997.
GARCEZ, Lucília; OLIVEIRA, Jô. Luiz Lua. Belo Horizonte: Editora Dimensão, 1998.
OLIVEIRA, Antônio Kydelmir D. de. Os Três Pilares da Música Popular Nordestina: Luiz Gonzaga - Jackson do Pandeiro - João do Vale. Fundação Vingt-Un Rosado / Coleção Mossoroense. Mossoró-RN. 1998.
OLIVEIRA, Gildson. Luiz Gonzaga: o matuto que conquistou o mundo. 7 ed. Brasília: Letraviva, 2000.
VIEIRA, Sulamita. O sertão em movimento: a dinâmica da produção cultural. São Paulo: Annablume Editora, 2000;
RAMALHO, Elba Braga. Luiz Gonzaga: síntese poética e musical do sertão. São Paulo: Terceira Margem, 2000;
MOTA, José Fábio da. Luiz Gonzaga: O Asa Branca da Paz. Universidade Vale do Acaraú.  Sobral. 2001.
ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A Invenção do Nordeste e Outras Artes. 2ª ed. Recife: Massangana, 2001.
ARLÉGO, Edvaldo. Luiz Gonzaga: O Pernambucano do Século. Editora Edificante. Recife, 2004.
MELLER, Luiz Ernesto. Luiz Gonzaga, uma vida iluminada. Recife, 2004.
SANTOS, José Farias dos. Luiz Gonzaga: a música como expressão do Nordeste. São Paulo: Ibrasa. 2004.
ARCOVERDE, Luiz; MERGULHÕES, Eronildes. Luiz Gonzaga o eterno cantador. Olinda: Editora Livro Rápido – Elógica, 2005.
ÂNGELO, Assis. Dicionário Gonzagueano, de A a Z.. 1ª ed. São Paulo: Parma, 2006.
ECHEVERRIA, Regina. Gonzagão e Gonzaguinha: uma História brasileira. Rio de Janeiro, Ediouro, 2006.

Kydelmir Dantas
AUSTREGÉSILO, José Mario, da Silva Lima. A Oralidade e a Imagética em Luiz Gonzaga: uma análise de conteúdo da obra musical do Rei do Baião. Recife, Faculdade Maurício de Nassau, 2006.
BARBOSA, José Marcelo Leal. Luiz Gonzaga: suas canções e seguidores. Teresina, Editora Halley, 2007.
PIMENTEL, Luiz. Mestres da Música no Brasil. Ed. Moderna, 2007.
TELES, José. O Baião do Mundo. Recife, Fundação de Cultura da Cidade do Recife, 2008.
AUSTREGÉSILO, José Mario. Luiz Gonzaga: O homem sua terra e sua luta. Fundação de Cultura do Recife. 2008.
CRUZ. Nelci Lima da. Vida e Trajetoria de um Mito chamado Luiz Gonzaga. Santa Luz – BA. 2010.
BARBOSA, José Marcelo Leal. Homenagens Especiais ao “Eterno Rei do Baião”. 2010.
TELES, José. Luiz Gonzaga. Fundação de Cultura da Cidade do Recife. 2011.
LOPES, Cacá. Vida e Obra de Gonzagão – O mais completo cordel ilustrado sobre Luiz Gonzaga. Ensinamento. São Paulo. 2011.
COSTA, Antonio Francisco & MEDEIROS, José Nobre de. Porque o Rei é Imortal. Editora. Salvador – BA. 2011.
VIANA, Arievaldo. O Rei do Baião - Do Nordeste para o Mundo. Planeta Jovem. 2012.
ARLÉGO, Edvaldo. Luiz Gonzaga Centenário. Editora Edificante. Recife, 2012.
    Kydelmir Dantas
    Sócio da SBEC, Conselheiro Cariri Cangaço
    MOSSORÓ - RN

O Aboio Por:Napoleão Tavares Neves


"O aboio é uma melodia plangente e quase sempre triste, dolente, com que os vaqueiros guiam o gado ou chamam ao redil as reses dispersas ou espalhadas".O aboio, as vezes tem letras e na maioria das vezes tem apenas a linha melódica, sempre dominada pelas vogais, buscando maior sonoridade, por certo. O aboio é a conversa amistosa e pacificadora do vaqueiro para com seu gado e o gado conhece o aboio do seu vaqueiro. O Aboio é uma conversa intima do homem para o animal. O bom vaqueiro conversa com o gado cantando na linguagem do aboio que é sempre monótona como uma canção de ninar e, talvez, por isso mesmo acalma e tranquiliza o gado.


O aboio é um canto de paz, de concórdia, de parceria do vaqueiro com o gado. A letra do aboio é sempre amistosa, tranquilizadora, usando-se muito as palavras manso e bonito. O aboio não excita, ao contrario tranquiliza o gado, levando-o a concórdia com o mudo testemunho do cavalo.


O aboio, antes de tudo, é uma mensagem de amizade do vaqueiro para o seu gado, em um dialogo, conduz a paz nos campos. Vaqueiros, cavalo e gado, sagrada trilogia do sertão celebrando a paz nas fazendas, envolto em um halo de entendimento e acentuado romantismo.


Dr. Napoleão Tavares Neves
Médico, Memorialista, Pesquisador e Escritor
Conselheiro Cariri Cangaço
Barbalha, Ceará.

Minha Experiência no Cariri Cangaço 2013 Parte II Por:Lamartine Lima

Lamartine Lima, sua esposa, Elisângela Silva e Manoel Severo

Depois da conferência de abertura, no Memorial do Padre Cícero, proferida por Luitgarde Barros, nos dias subseqüentes tomamos a estrada para conhecer locais significativos nos Cariris Novos, pelos municípios de Milagres, Mauriti, Barro, Porteiras, Missão Velha, Aurora, Barbalha e Crato, através de excursões, exposições e palestras dirigidas sobre a importância dos fatos ali ocorridos, na História do Ciclo Sociológico Criminal do Cangaceirismo, aliás contido no grande Ciclo Sociológico Político do Coronelismo.      

Assim foi que empreendemos visita a lugares históricos, como a casa da fazenda do Coronel Domingos Furtado, no município de Milagres; a Igreja e a casa do Padre Lacerda, chefe político do Coité, em Mauriti; a casa da Fazenda Timbaúba, de Dona Chiquinha Pereira, tia do célebre cangaceiro Sebastião Pereira, onde conhecemos os senhores Hagahu Araújo e Wilson Póvoa, netos de Dona Chiquinha e filhos do fazendeiro, cangaceiro e depois comerciante Luis Padre, todos descendentes do Barão do Pajeú, mais as bonitas bisnetas, uma delas filha de uma neta do Coronel Abílio Wolney, do antigo São José do Duro, em Goiás, esposa de Wilson, com os quais assistimos o descerramento de placas comemorativas na fazenda e no átrio da Igreja de Santo Antonio, no Barro; também ali, fomos à fazenda do Coronel Zé Inácio do Barro, e, mais tarde, na sede do município, ouvimos a palestra de Leandro Cardoso sobre o fazendeiro, cangaceiro e depois farmacêutico prático Sinhô Pereira, famoso predecessor e chefe de Lampião.

Caravana Cariri Cangaço no Coité e abaixo, Luitgarde Barros e Lamartine Lima na Igreja do Coité 
Caravana Cariri Cangaço na fazenda do Major Zé Inácio do Barro

Visitamos, em Porteiras, a Fazenda Piçarra, vimos o local onde tombou o cangaceiro Sabino das Abóboras, e ouvimos Vilson, neto do antigo proprietário, falar sobre o seu avô Antônio da Piçarra, que acolheu os familiares de Lampião, uma de suas irmãs, o irmão Ezequiel e o cunhado Virgínio Fortunato, estes últimos que se transformariam, respectivamente, nos cangaceiros Ponto Fino e Moderno, ambos mortos em combate contra as forças volantes da polícia; estivemos na Fazenda Guaribas e vimos os restos carbonizados da casa grande, enquanto ouvíamos Manoel Severo dissertar sobre Chico Chicote, que morreu acuado dentro do incêndio e lutando contra as volantes; depois, no Ginásio de Esportes da sede municipal, assistimos à conferência de Múcio Procópio acerca de Antonio Conselheiro e à Guerra de Canudos.

Lamartine Lima, Luitgarde Barros, Leandro Cardoso, Ivoneilde Leite e Manoel Severo, na Piçarra - Cariri Cangaço 2013
 Jantar anfitrionado pelo prefeito de Porteiras, Manoel Novaes. Abaixo: Lamartine Lima, Manoel Severo e Geraldo Ferraz em Porteiras, Ceará. 

Em Missão Velha, visitamos a antiga residência do Coronel José Gonçalves, que, principalmente, fora a casa do Coronel Isaias Arruda de Figueiredo, o qual, aos 26 anos de idade, foi o primeiro prefeito do município; conhecemos, com 90 anos de idade, a sua filha, Dona Orlandina Arruda, uma neta e uma bisneta, assistimos com elas o descerramento do seu retrato na sede da Prefeitura Municipal e ouvimos a conferência do escritor João Tavares Calixto Júnior sobre aquele político; o jovem coronel Isaias Arruda esteve envolvido com o assalto de Lampião à cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte, no ano de 1927, e, por motivos de disputa de poder regional, seria assassinado meses depois, aos 28 anos de idade, na estação ferroviária da cidade de Aurora, local do crime que mais  tarde  visitaríamos; passamos pela fazenda do Coronel João Santana de Jamacaru, Gameleira de São Sebastião da Serra do Mato e visitamos, no Alto do Leitão, as sepulturas de alguns irmãos cangaceiros do antigo grupo de Bom Devera que ali foram fuzilados.

 Dona Orlandina, filha de Izaias arruda recebe a Caravana Cariri Cangaço 2013
Luitgarde Barros e Lamartine Lima em almoço em Jamacaru, terra do Cel Santana em Missão Velha

No município de Aurora, visitamos a Fazenda Tipi, da antiga matriarca do lugar, Dona Marica Macedo, e ali ouvimos palestra sobre as visitas de Lampião ao local, proferida pelo advogado Vicente Landim de Macedo, neto daquela fazendeira, o qual reside no Distrito Federal, lição que seria complementada, mais tarde, no auditório da Escola Técnica Federal do Araçá, na sede municipal, com uma admirável conferência sobre os seus ancestrais, desde o século XVIII, a história daquela região e de sua avô Dona Marica; ainda, visitamos a Fazenda Ipueiras, do Coronel Isaias Arruda, local dos seus encontros com Lampião e seu bando, onde, depois do fracasso do ataque a Mossoró, houve a traição sobre aquele chefe de cangaceiros, quase encurralado pela polícia em um fogo memorável.  

Vicente Landim, João de Zeca e Lamratine Lima na fazenda de Marica Macedo no Tipi, em Aurora e abaixo: Lamartine Lima, Manoel Severo e Vicente Landim. 
Casal Lamartine Lima e José Cícero na noite Cariri Cangaço em Aurora

No Hotel das Fontes, no Balneário de Caldas, na cidade de Barbalha, avistando a Serra do Araripe, foram apresentados os roteiros históricos turísticos do Cangaço, por João de Souza Lima e Jairo Oliveira, depois pronunciada a conferência sobre Etnofarmacobotânica do Geopark Araripe, pela doutora Maria Thereza Camargo, especialista de São Paulo, e, finalmente apresentei resumo do meu trabalho.

 Jonasluis DA SILVA, de Icapuí, Lamartine Lima e Luitgarde Barros em Barbalha - Cariri Cangaço 2013 
Profa. Maria Thereza Camargo e Lamartine Lima em Conferência no Caldas - Barbalha Cariri Cangaço 2013

Naquela noite, no Largo da Estação Ferroviária do Crato, houve o lançamento ou relançamento de treze livros e um filme, da dúzia de películas e documentários oferecidos aos participantes do Seminário. A data de 22 de setembro de 2013 marcou o final do período de seis dias de intensa experiência de participação intelectual e física no estudo aplicado à História do Ciclo do Cangaceirismo, com admirável reunião de amizade e atividade produtiva, amável convivência em um ambiente de absoluta integração, proporcionado pelos organizadores do IV - Seminário Cariri Cangaço – 2013, sob a direção perfeita do Doutor Manoel Severo Gurgel Barbosa, que, entre tantas coisas que conseguiu para os seminaristas, obteve o apoio integral das prefeituras da terra caririense, tornando-se merecedor de todos os aplausos.  

Os bienais Seminários Cariri Cangaço representam, hoje, no mundo intelectual do Brasil e do Exterior, o foro mais importante de apresentação e discussão de estudos e pesquisas e outros trabalhos correlatos acerca do Cangaceirismo. 

Lamartine Lima
Gravatá-Pernambuco

A Morte do Cangaceiro - Uma cruz a beira do caminho Por:Honório de Medeiros


A cruz de aroeira, carcomida pelo tempo – teria quase oitenta anos, repousa sob uma plataforma de tijolos grosseiros que alguma alma caridosa houve por bem construir à margem da muito antiga estrada do cajueiro, que liga Limoeiro a Mossoró. Originariamente, percebe-se facilmente, a cruz estava plantada diretamente no solo calcário. Hoje, inclusive, existe uma pequena cavidade por trás da cruz, construída com tijolos, talvez para receber velas.

Um pouco à esquerda, uma oiticica centenária zomba da fragilidade humana derramando sua sombra testemunha daquele dia fatídico. Mais além, um denso mar de algarobas, marmeleiros, juremas, mufumos, todos acinzentados pelo pó que o vento quente revolve, dá uma precisa noção do tipo de homem que é capaz de enfrentá-lo: o sertanejo!

Ali estava sepultado um tipo de sertanejo que já não existia mais. Pelo menos como nos moldes de antigamente. Um cangaceiro. Menino de Ouro? Alagoano? Dois de Ouro? Az de Ouro? Não é provável que sejam os dois primeiros, por que há relatos de fontes primárias quanto à presença deles em episódios posteriores envolvendo o cangaço. A dúvida é: qual dos dois restantes? Dois de Ouro ou Az de Ouro? Se obedecermos à ciência, que nos manda respeitar o testemunho de quem presenciou os fatos, a tendência é que tenha sido Dois de Ouro.



Honório de Medeiros, Manoel Severo e Ivanildo Silveira

Naquele dia fatídico, fugindo a passo acelerado de Mossoró, onde perdera Colchete e Jararaca, Lampião carregava consigo, tomado por dores cruciantes, esse cangaceiro que teria sido atingido por uma bala que lhe destruíra o nariz. Bala essa disparada por quem guardava os fundos da casa do Coronel Rodolpho Fernandes, respondendo ao ataque desferido sorrateiramente por comandados de Massilon, enquanto Jararaca, Colchete, e outros, ensandecidos por cachaça e adrenalina, distraiam os defensores postados à frente do casarão do Prefeito.

Lampião já parara em uma casa humilde – esse episódio é por demais conhecido – e obtivera água e sal para lavar o ferimento. Coberto de sangue, com a cabeça envolvida por um lenço sujo, o cangaceiro, entretanto, não conseguia continuar. E, à sombra da oiticica, decidiu morrer. Pediu que lhe matassem – não queria continuar. Fera tinha sido, fera era, morreria como fera. Nisso se assemelhava a qualquer samurai, que vivia para morrer, órfão do culto à batalha, às armas, e à violência.

Após muita discussão um tiro reboou no silêncio pesado da caatinga. Um seu companheiro o executou e o sepultaram em cova rasa.

No entorno da sepultura há muitas pedras – calcário. São pedras milenares. Testemunharam tudo. Pudessem relatar o que viram e ouviram contariam a nós acerca daquele momento tenebroso. Saberíamos, talvez, quem de fato teria sido o cangaceiro executado a pedidos. Diriam a nós um pouco mais acerca desses homens-feras que não temiam a morte, a sede, a fome, caminhadas sem fim por sobre um chão inóspito, debaixo do sol inclemente, fendendo a braçadas a caatinga áspera.



Bando de Lampião em Limoeiro do Norte logo após o ataque a Mossoró

Não temiam os inimigos naturais – as volantes, os “macacos”, a resistência, quando havia, dos habitantes do Sertão a quem atacavam. Não temiam a traição permanente dos coiteiros e coronéis com os quais constituíam essa página da história do Brasil recém saído da monarquia. Não temiam a morte. Não temiam nada.


Para esse cangaceiro desconhecido deixamos nossa perplexidade, algumas orações, muitas perguntas não respondidas e uma vela acesa, solitária, com a chama a teimar, trêmula, em sobreviver lutando contra o vento quente do Sertão.

Passados todos esses anos, quase um século, sua lembrança sobrevive na curiosidade de alguns apaixonados pela história do cangaço, coronéis, cantadores de viola, repentistas, místicos, jagunços, fanáticos, almocreves, todos que construíram a saga dos antepassados fundadores da cultura sertaneja nordestina, na terra sagrada por onde perambulou Lampião, Padre Cícero, o Coronel Zé Pereira e o grande, talvez o maior de todos, Zé Limeira, o poeta do absurdo...

Honório de Medeiros
Pesquisador, Escritor, Conselheiro Cariri Cangaço 

Minha Experiência no Cariri Cangaço 2013 Parte I Por:Lamartine Lima

Lamartine Lima no Cariri Cangaço 2013

A primeira vez que ouvi falar sobre os Seminários Cariri Cangaço foi no início do ano de 2012, em nossa casa de Gravatá, Pernambuco, quando estava recebendo à bem vinda visita do pesquisador, escritor e confrade Geraldo Ferraz, da Academia de Letras e Artes daquela cidade. Tratávamos sobre um texto meu que ele solicitara para o seu livro, que havia acabado de escrever, acerca do cangaceiro e depois soldado Dé Araújo, e Geraldo referiu-se com entusiasmo àquelas reuniões periódicas de estudiosos do Ciclo Sociológico Criminal do Cangaceirismo, que aconteciam em terras do Ceará.

No meado deste ano de 2013, resolvi revisitar a região onde se encontra a Usina Hidrelétrica de Xingó, que já conhecia havia uma década, e realizar o passeio turístico pelos chamados “cânions” do Rio São Francisco, entre os estados de Alagoas e Sergipe. E, lembrando-me que no dia 28 de julho fariam 75 anos de um acontecimento muito importante para o sertão nordestino, o qual determinou o princípio do fim do Cangaceirismo – fenômeno com características próprias e único no mundo –, a morte de Lampião, o maior dos chefes de cangaceiros do Nordeste do Brasil, mais sua mulher Maria Bonita e nove de seus cabras, e um defensor da lei, o soldado da polícia alagoana Adrião Pedro de Souza, determinei-me a, naquela data, ir ao local do seu último combate, ali perto, a Grota de Angico.

Dr.Lamartine Lima, Jairo Luiz e Manoel Severo na Grota do Angico em 2013

No dia anterior àquela data histórica, na cidade alagoana de Piranhas, em restaurante, com minha família, estava terminando de almoçar típica peixada, quando ouvi alguém avisar que ia começar, no auditório próximo, palestra sobre Cangaceirismo. Então, soube que acontecia na cidade um conjunto de conferências, debates e apresentações de cinema e teatro denominado Semana do Cangaço. Fui assisti-la. Lá, encontrei o amigo, pesquisador e escritor João de Souza Lima, que imediatamente apresentou-me ao mentor dos Seminários Cariri Cangaço, Manoel Severo, mais Jairo Oliveira, Juliana Ischiara, Antonio Vilela, Archimedes Marques, Ângelo Osmiro e o livreiro Pereira Lima, entre outros, todos também seminaristas. Recebi logo o convite de João, Jairo e Severo para, na manhã seguinte, embarcar no catamarã que eles disponibilizaram para ir ao porto fluvial da Forquilha e, de lá, em caravana a pé, irmos à Grota de Angico, participar da cerimônia comemorativa, na qual seria celebrada missa. E assim aconteceu.  

Juliana Ischiara, João de Sousa Lima, Lamartine Lima, Manoel Severo e Letícia na abertura da Semana do Cangaço - Cariri Cangaço em Piranhas / 2013

Uma quinzena depois, recebi, através de correspondência eletrônica, o convite formal de Doutor Manoel Severo Gurgel Barbosa, pioneiro dos congressos e organizador do IV – Seminário Cariri Cangaço – 2013, no qual se reuniriam membros da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço, componentes de associações de estudiosos de alguns estados nordestinos sobre Cangaceirismo, e pesquisadores e escritores de muitos estados do Brasil, a começar no dia 17 de setembro, na cidade de Juazeiro do Norte, no Cariri do Ceará, para participar com uma palestra sobre tema de minha especialidade: os estudos de Antropologia Criminal e as cabeças dos cangaceiros que estiveram guardadas por três décadas no Instituto “Nina Rodrigues”, em Salvador, Bahia. Honrado pela deferência, logo aceitei.

Em Juazeiro do Norte, logo que cheguei ao hotel, encontrei e festejei os velhos amigos Geraldo Ferraz, a antropóloga e socióloga, professora doutora, pesquisadora e escritora Luitgarde Barros – que, entre outros trabalhos importantes, tem três livros sobre o Cariri –, e o maior, mais antigo e acatado dos pesquisadores sobre cangaceiros, escritor de quase uma vintena de livros, Antonio Amaury Corrêa de Araújo.

Luiz Ruben, Narciso Dias, Antonio Amaury, Jairo Luiz e Jorge Remigio no Hotel do Cariri Cangaço 2013

Depois, foram aparecendo: o anfitrião Manoel Severo, grande articulador do Seminário, muitíssimo bem relacionado com o mundo intelectual e político do Cariri e profundo conhecedor de Cangaceirismo; Antonio Vilela, o escritor que fez lembrar a memória do único defensor da sociedade tombado em Angico e ali colocou a cruz do soldado Adrião Pedro de Souza; o colega médico, estudioso, conferencista e escritor Leandro Cardoso Fernandes; a jurista e conferencista Juliana Ischiara, devotada à lembrança do escritor e memorialista Alcino Alves Costa, pranteado em tocante homenagem dos seminaristas à sua memória; o escritor Archimedes Marques, defensor do resguardo da moral de um homem, mesmo tendo ele sido um cangaceiro cruel; o estudioso dos cabras do sertão e realizador de turismo regional piranhense Jairo Oliveira; o escritor Ângelo Osmiro, presidente daquela sociedade de estudiosos do Cangaço, que trouxe e distribuiu o jornal da sua associação, com importantes artigos; o livreiro Pereira Lima; e Lili, filha de Moreno e Durvinha, antigos cangaceiros que conheci há alguns anos em Fortaleza, apresentados pelo nosso amigo Antonio Amaury.

Fui também apresentado ao jurista interessadíssimo nos assuntos do Cangaceirismo, o dinâmico Ivanildo Silveira, e a Sabino Basseti, escritor de um importante livro, analisando as contradições sobre a morte de Lampião; e foram chegando outros, como Múcio Procópio, especialista na Canudos do Bom Jesus Conselheiro; Luiz Ruben, pesquisador e escritor; Rubinho Lima, também escritor; Paulo Gastão, escritor e referência entre os pesquisadores do cangaço em Mossoró, Rio Grande do Norte; Kydelmir Dantas, parceiro de João de Souza Lima na divulgação de pesquisas inéditas sobre Cangaceirismo; Jonasluís da Silva de Icapui, professor universitário e cineasta documentarista...


Senti falta de quatro amigos nossos e notáveis intelectuais dedicados ao estudo dos sertões e dos cangaceiros: Frederico Pernambucano de Mello, do Recife; Sérgio Augusto Dantas, de Natal, Oleone Coelho Fontes e Manoel Neto, ambos de Salvador. 

Continua...

Lamartine Lima
Gravatá - Pernambuco

Consolidação de um grande evento Por:José Soares Neto

Soares Neto e equipe de Barbalha recebem Cariri Cangaço 2013

Caro amigo Severo, mais um ano de muita luta e muito brilho com o Cariri Cangaço de 2013. Com a consolidação deste grandioso evento devemos partir para uma segunda vertente nos anos vindouros, que seria a condição de podermos inserir neste período grandes palestras nas escolas de ensino médio dos municípios participantes; com isto, buscaríamos alcançar um público que em seu dia a dia, não têm a menor oportunidade de desfrutar de temas tão apetitosos e brilhantemente apresentados por seus respectivos palestrantes. 

Que 2014 o sucesso seja ainda maior, pois os eixos temáticos do Cangaço quando a gente menos espera, ai é que tem coisa boa para se debater, descobrir novas amizades, bem como o reconhecimento de novos personagens através de lançamentos de livros, de conhecedores do cangaço, bem como, o desenvolvimento no campo do turismo de visitação com a construção de uma Rota do Cangaço na Região do Cariri Cearense, proporcionando a geração de emprego e renda movimentando a cadeia da economia criativa. Sucesso e até mais vê-lo. 

Soares Neto
Barbalha, Ceará

Uma História de Amor e Fúria: Da Balaiada ao Cangaço Parte II Por:Verônica Kobs


Se a Balaiada é uma espécie de movimento precursor do Cangaço, a análise que se faz de uma revolta também vale para a outra. Nesse aspecto, importa, sobremaneira, a revisão que se faz das “figuras de herói (Duque de Caxias) e vilão (o Balaio, líder do movimento)”. No final do século XX, às vésperas de o Brasil completar 500 anos, vários momentos e personagens fundamentais de nossa História foram revisados, em um processo longo e determinante para a reconstrução da identidade nacional, baseado em uma leitura mais crítica e questionadora dos fatos e no apagamento das divisas entre Ficção e História. 

Os filmes Carlota Joaquina, princesa do Brazil; Desmundo; e Baile perfumado são alguns exemplos dessa reavaliação histórica, cujo principal objetivo era, a partir do distanciamento, da objetividade, apresentar os dois lados de cada questão, permitindo reflexão, crítica e propiciando até mesmo a invalidação dos mitos construídos pelo discurso histórico ao longo do tempo.


O Baile Perfumado

Dessa forma, a nova análise que pode ser feita do movimento da Balaiada (e que, pela relação resgatada em Uma história de amor e fúria, vale também para o Cangaço), em contraposição ao discurso histórico (e hegemônico), enfatiza mais as causas das revoltas (ou seja, o que levou os balaios e os cangaceiros a agirem como agiram, confrontando o poder oficial), destaca o aspecto humano dos movimentos e problematiza a manutenção da ordem a qualquer preço (com a vitória dos governantes e a derrota dos revoltosos por morte ou prisão).

A exemplo da Balaiada, o Cangaço também agia contra o Estado. Até mesmo as ações de Jesuíno Brilhante e de Lampião são em parte justificadas pela sede de vingança contra a Polícia. Isso sugere os desmandos e os abusos de poder daqueles que deveriam proteger e manter a ordem, mas que cometiam atrocidades, em nome do poder oficial. De fato, os papéis de herói e vilão não eram bem delineados, de modo que contradição e ambivalência atingiam todas as esferas de poder (incluindo a Polícia, os donos de terra e também os movimentos da Balaiada e do Cangaço). Aliás, esse tipo de conflito é comum a todos os movimentos políticos e sociais. Por trás de toda revolta e de todo líder revolucionário há um rastro de violência e de tragédias. 



Entretanto, o outro lado aparece na luta pelos ideais e no perfil de coragem e tenacidade de quem comanda a reação. Negro Cosme, por exemplo, que foi um dos líderes da Balaiada, “no período, foi visto por muitos como um bandido sanguinário, um facínora sem escrúpulos e até como feiticeiro chegou a ser tratado. Muitos desconhecem suas qualidades de grande líder” (SOUSA, 2013). 

Com Lampião não foi diferente. Hobsbawn analisa esse tipo de duplicidade fazendo uso do conceito de “bandido social” para se referir àqueles que são “encarados como criminosos pelo Estado, mas que continuam a fazer parte da sociedade camponesa e são considerados por sua gente como heróis, como campeões, vingadores, paladinos, justiceiros, talvez até mesmo líderes da libertação (...)” (HOBSBAWN, 1969, p. 73).

Também relacionadas à causa de muitos sertanejos terem decidido entrar para o Cangaço estavam as tentativas de ascender social e economicamente e de garantir a proteção da família e de suas propriedades. A “política do medo”, a certeza do poder extraoficial e o mito da justiça social eram consequências da vida no Cangaço e, para muitos, significavam a possibilidade real de alcançar o que o poder oficial por si só não garantia a todos. Essa é mais uma semelhança entre os balaios e os cangaceiros, que acreditavam no levante como única forma de lutar por melhores condições de vida (e, muitas vezes, pela sobrevivência), em uma sociedade em que as leis e os direitos não eram iguais para todos. 

Evidente que isso não se relaciona apenas ao aspecto antropológico que o diretor de Uma história de amor e fúria quis enfatizar, como afirmou nas entrevistas em que falou sobre o filme, mas associa-se também à hierarquia e ao escalonamento social, próprios da filosofia marxista. Em ambos os casos, importam as diferenças entre os grupos sociais e os acordos e conflitos que elas estabelecem. 

Como na Balaiada e nos demais episódios históricos representados no filme de Bolognesi, o Cangaço surgiu como um grito da sociedade civil contra o poder hegemônico. O atavismo que é mostrado na trajetória do protagonista do filme não está apenas nas sucessivas rebeliões. Ele aparece também nos diferentes modos de dar nome às classes participantes dos conflitos: ricos e pobres; patrão e operário; colonizador e colonizado; senhor e escravo; dominante e dominado. Mudam os nomes, muda a História, só não muda a política de dominação (que justifica a ênfase dada ao maniqueísmo, no filme), razão de inúmeras guerras - as que já foram e as que ainda estão por vir.

Verônica Daniel Kobs
Professora de Imagem e Literatura e de Literatura e Estudos Culturais, 
no Mestrado em Teoria Literária da Uniandrade (Curitiba-PR). 

Referências:

<http://www.outraspalavras.net/2013/04/26/em-uma-historia-de-amor-e-furia-visao-
sombria-do-brasil/>. Acesso em: 30 mai. 2013.
GUIMARAENS, G. Crítica: Uma história de amor e fúria. Disponível em:
<http://www.getro.com.br/2013/04/critica-uma-historia-de-amor-e-furia/#.UYvARaKOTBg>. Acesso em: 30 mai. 2013.
HOBSBAWN, E. Bandidos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1969.
PASTORELLO, F. Uma história de amor e fúria. Disponível em:
<http://fabiopastorello.blogspot.com.br/2013/04/uma-historia-de-amor-e-furia.html>. Acesso em: 30 mai. 2013.
SCHENKER, D. Entrevista: Luiz Bolognesi. Disponível em:.
Acesso em: 25 nov. 2013.
SCHWARZ, R. As idéias fora do lugar. In: _____. Ao vencedor as batatas. Forma literária e processo social nos inícios do romance brasileiro. São Paulo: Livraria Duas Cidades; 34, 2000.
SERRA, A. A Balaiada. Rio de Janeiro: Bedeschi, 1948.
SOUSA, R. M. da C. Negro Cosme: uma página esquecida de nossa história. Disponível em: <http://www.outrostempos.uema.br/curso/anaisampuh/anaisramses.htm>. Acesso em: 26 nov. 2013.
UMA HISTÓRIA de amor e fúria. Direção de Luiz Bolognesi. BRA: Gullane Filmes; Europa Filmes, 2013. 1 dvd (75min); son.