Angico por Paulo Gastão

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Paulo Gastão, Severo, Lemuel e Aderbal

Angico se constitui no calcanhar de Aquiles do cangaço lampiônico. A construção do mito e seus asseclas desmoronam de forma vertiginosa. Se desejam o término do cangaço com o episódio de Angico, considero uma aberração, final trágico e desabonador da saga de homens assassinos, porém, valentes e destemidos. 
A história dos cangaceiros deve ser vista de vários ângulos.
A descrição concebida pelos escritores, jornalistas, pesquisadores deixam Gengis Kan, Napoleão, Júlio César (O imperador), Al Capone, Billys the Kid, Kelly (e seu bando), Hitler e muitos outros, fichinha frente aos cangaceiros.

O cangaceiro Candeeiro me fez o seguinte relato, em sua residência na vila de Guanumbi, no município de Buíque, estado de Pernambuco: 
“Na noite anterior ao ocorrido, ou seja, 27 de julho de 1938, Lampião reuniu seus homens e assim falou: “-Amanhã cedinho vou viajar. Vou embora para Minas ou Goiás. “Quem quiser ficar, fica, quem quiser ir comigo se prepare.” Continua o chefe cangaceiro: “-Não posso mais ficar por aqui, pois, vou começar a matar até meus amigos; voltar para Pernambuco, não volto, pois, lá só tenho inimigos e a matança vai continuar. Assim o melhor é terra nova, onde ninguém me conhece”. A conversa foi encerrada e todos foram dormir pensando na decisão e na hora de ficar ou seguir o comandante. Tenho este depoimento gravado, com testemunhas na hora da gravação. 



Manoel Dantas Loiola, o Candeeiro; por Márcio Vasconcelos
 
De última hora é colocado um parente que dizem, ser de Lampião e de nome José. Foi arranjada máquina de costura para confeccionar roupa para o rapaz. Não é descrito como o mesmo lá chegou, e muito menos após o tiroteio do dia seguinte, qual teria sido seu destino. Até parece com história de Dom Sebastião, Rei de Portugal. O belo e valente monarca foi lutar no norte da África e após a renhida luta, ninguém encontra o Rei. Caracteriza-se que Dom Sebastião havia se “encantado”. Não se fala em morte em ambos os momentos.


Os cachorros pela primeira vez estavam sonolentos e teriam perdido o faro. Dormiam nas pernas dos seus donos. Junto aos cachorros deveriam estar às sentinelas que devem ter esquecido as suas responsabilidades junto ao grupo. Falha lamentosa. 
Naquela manhã chovia na área. Comprove esta afirmação no livro de João Bezerra, onde solicita aos seus comandados que: “-Tenham cuidado em pisar no chão para não fazer barulho com as folhas secas”. Parece-nos que a chuva não atingia as folhas, enquanto o restante do chão corria água. 

A coragem da volante (grupo de militares) era tamanha que o comandante permitiu o uso de cachaça para quem desejasse criar coragem. Esta declaração me foi prestada por um membro da volante que ainda está vivo. 
Aos registros feitos por todos que escreveram sobre o tema, mostram que as relações entre o chefe cangaceiro e o militar aconteciam para um jogo de 31, compra e venda de armas e munição, além de um bom trago de bebida especial. Sendo o coito a margem de um caminho, que liga a casa da fazenda ao Rio São Francisco, logo mais abaixo, verificamos que as descrições, todas, todas são falhas, pois na realidade não existia nenhuma segurança para com a permanência do grupo.

Volante do Tenente João Bezerra

As águas que correm no riacho do Tamanduá descem com muita velocidade até o rio, desde que a serra forma um plano inclinado muito acentuado. Tempo de inverno, água no riacho, onde fixar a tolda e dormir? Cangaceiros acordados, inclusive o chefe, que manda o companheiro de nome Amoroso ir buscar água logo abaixo do coito, no poço (formado na época das chuvas) que fica a 200 metros para fazer o café. Amoroso é baleado com um tiro de fuzil. Este momento não foi o suficiente para deixar os cangaceiros em condição de luta?A polícia queria os cangaceiros ou o ouro e dinheiro que eles transportavam? Por que a retirada dos anéis, cortando-se os pulsos e levando-se o conjunto, mãos e anéis? 
O governo da Bahia oferecia 50:000$000 (cinquenta contos de réis), a quem entregasse Lampião vivo ou morto. Não se tem notícia do ganhador do prêmio milionário. Por quê? 
Quem nominou as cabeças errou gravemente. Muitos escritores colocam nos seus relatos que metade das cabeças tem o mesmo nome. A partir do meio (fotos das cabeças) para cima seja como Deus quiser. Encontraram um cangaceiro que só aparece naquele momento chamado de Desconhecido? Até então não existe nenhuma informação sobre este personagem? Por outro lado Amoroso foi baleado ou morto, em primeiro lugar, e seu nome é totalmente esquecido. Como explicar?




Se a volante possuía duas metralhadoras não ficava um pé de macambira para contar a história. Por que conseguiram se salvar muitos cangaceiros? O cerco não foi cerco. É piada. 

Durval Rosa, irmão de Pedro de Cândido, em depoimento a mim prestado e registrado em fita de vídeo, declara que na noite anterior ele desceu a serra e foi levar um saco de balas, dividido em duas porções, em cima de um jumento. “Era muito peso”, dizia o entrevistado. Para que tantas balas? Que desejaria o capitão fazer com o material?

Existia a compra de armas e balas, porém, se quem servia de intermediário para que farto material chegasse às mãos dos bandidos? Um militar que atuou na volante que chegou a Angico foi curto e grosso. “-A polícia!” Minha intenção é fazer um artigo, porém, se nas páginas de um jornal coubesse as informações, conclusões a que cheguei escreveria um livro. E mais, o livro já estaria em fase de acabamento. Existindo alguma dúvida do leitor, lhe faço um convite – vamos ao estado de Sergipe e lá você encontrará os elementos que lhe darão o norte de toda a história. Não sou o dono da verdade, porém, não quero lhe deixar enganado, nem tão pouco morrer na ignorância, na mentira. A história do povo nordestino e dos cangaceiros é outra, não se iluda. Caso o leitor não fique satisfeito, farei um outro artigo ainda mais contundente sobre o episódio. Chega de tanto embuste. 

O matador dos onze cangaceiros diz que feito o cerco tiveram que recuar. Ora, difícil era chegar perto daquelas feras, quanto mais, ter a chance de ir e voltar. Momento único desde o início do cangaço no século anterior. 
O suicídio de Luiz Pedro é fantástico. É advertido ao cangaceiro que Lampião estava morto e que ele fosse à luta. Ao chegar junto ao amigo, assim falou: “-Compadre, eu lhe disse que lutaria com você até a morte”. No trajeto, o Pedro perdeu a coragem que foi possuidora desde os tempos em que esteve no Rio Grande do Norte, em 1927. 

O conceito de cerco efetuado pela volante não determina a figura geométrica do círculo. Acredito que definir como lua crescente é razoável. Teria que se deixar uma válvula de escape e ela existiu. Os cangaceiros se evadiram em busca da parte da alta da fazenda e, por incrível que pareça, não foram perseguidos. A saída esteve sob comando do Ten. Bezerra. 
Que você acha disto? 

Houve traição? Existe divergência. Um grupo diz que não. Outro diz que sim. Quem traiu? Afirmam que o grande traidor foi o homem que se caracteriza como seu matador, ou seja, João Bezerra. E o envenenamento? No coito o cangaceiro Zé Sereno avisou: 
“-Capitão, a tampa da garrafa tem um pequeno furo”. O chamamento da atenção não foi levado em consideração. Por quê? 
Se salva Sila. Personagem único que ficou para contar a história. Foi a predestinada para fazer o relato em nome de todos os sobreviventes. Por quê? O que na realidade aconteceu o que não podia existir divergências nos relatos? Impossível. Se vamos a uma festa, ou a qualquer lugar, cada um tem uma visão própria do ocorrido. Os primeiros escritores deixaram-se levar na conversa. O resultado é o que aí está.

Fonte:blogdomendesemendes.blogspot.com
Blog do amigo José Mendes
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12 comentários:

Anônimo disse...

A foto de Candeeiro e simplesmente bela. Aderbal Nogueira

Lima Verde disse...

Sei que alguns, ou talvez muitos, venham a dizer: De novo Angico??? Mas, diante dos lúcidos textos dos muitos pesquisadores, aqui mesmo neste blog do Cariri Cangaço, como Alcino Costa, Alfredo Bonessi e agora Paulo Gastão, é notório o conjunto de informações importantes e reflexões trazidas a cerca do mais polêmico fato do cangaço de Lampião, dessa forma parabens a Severo pelo grande trabalho e ao pesquisador Paulo Gastão pelo excelente artigo.

Abraço a todos.

Fernando Cesar Lima Verde

Karla Renata disse...

Concordo com Aderbal; Severo que fotografia linda do Candeeiro, simplesmente uma obra de arte, bárbara. Parabens ao fotografo Márcio Vasconcelos e a este blog, uma visita obrigatória todo dia.

beijos a todos
KARLA

Anônimo disse...

Paulo Gastão, concordo com o calcanhar de aquiles ser Angico, e não adianta dizer que o assunto está encerrado, como encerrado se tantas dúvidas ainda persistem por mais de 80 anos. História é para ser discutida à exaustão, parabens a vcs dos blog.

DIVINA COMÉDIA

Unknown disse...

Pessoal do blog, tambem acho que angico não está esgotado, concordo com o paulo gastão. Pergunto: Porque só alguns depoimentos são considerados críveis? é muito bom ter o espaço de vcs para conhecer, discutir e aprofundar o cangaço.

Urbano Reis

Julio Cesar disse...

Verdades e mentiras de Angico...

Se prepare mestre Alcino, porque a discussão está apenas começando.

Grande Paulo Gastão... mexendo na fogueira e espalhando as brasas.

Juliana Ischiara disse...

Amigo e confrade Paulo Gastão,

A priori deveria lhe parabenizar pelo belo e instigante artigo, porém, vou inverter a ordem das coisas... parabéns pela coragem, pela ousadia de escrever o que você realmente pensa sobre o episódio Angico, infelizmente, nem todos os pesquisadores se atrevem a discordar do que está posto “goela abaixo” pelos memorialista tidos como os papas da temática cangaço.

Não ter coragem de discordar é antes de tudo colaborar para perpetuação de uma história mal contada, como diz nosso amigo João de Sousa Lima, uma história escrita por pessoas que não tem o mínimo de responsabilidade para com os fatos históricos em sua plenitude e veracidade.

Meu amigo tens toda razão, a busca pela verdade real ainda é o melhor a ser feito.

Saudações Cangaceiras

Juliana Ischiara

Anônimo disse...

Severo me surpreende sua determinação e seu trabalho, conhecendo como conheço seu dia a dia, fantástico meu amigo. Parabens por manter esse espaço sensacional.

Pádua

CARIRI CANGAÇO disse...

Caro Pádua, muito obrigado por suas palavras. O combustível para continuarmos perseverando nesta grande construção coletiva são manifestações com a sua. Fico feliz por contar com todos vocês.

Mesmo que eu não deseje, Angico não consegue sair de pauta, rsrsrsrs;

Abraços queridos amigos.
E meu caro Aderbal, que fotografia de Candeeiro feita pelo Marcos Vasconcelos, sensacional!

Manoel Severo

Anônimo disse...

BACANA TODAS ESSAS DIVAGAÇÕES SOBRE O TEMA, MAS NÃO CONCORDO COM ALGUMAS SUPOSIÇÕES.

VOLANTES E CANGACEIROS VINHAM DE UMA MESMA SOFRIDA SOCIEDADE, EMBORA UMA DELAS SEJA OFICIAL E OUTRA MARGINALIZADA, MAS NO FUNDO MESMO O QUE INTERESSAVA ÀS VOLANTES, ERA A CABEÇA DE LAMPIÃO.

SOBRE AS METRALHADORAS: NÃO É POR QUE SE TINHAM METRALHADORAS, QUE SEUS OPERADORES ACIONARIAM O GATILHO PARA TODOS OS LADOS. ERAM ARMAS PESADAS, DIFÍCEIS DE MANUSEAR E DE USO NÃO MUITO CONSTANTE, O QUE VEM A CONDICIONAR SUA UTILIZAÇÃO COM BASTANTE CAUTELA. PORTANTO, É POSSÍVEL SIM QUE ALGUNS "PÉS DE MACAMBIRA" TENHAM SE SALVADO.

OUTRA SITUAÇÃO, EM RELAÇÃO À PREMIAÇÃO OFERECIDA PELO GOVERNO DA BAHIA: ERA UMA PREMIAÇÃO DESTINADA A CIVIS E MILITARES BAIANOS. A VOLANTE QUE PÔS FIM A LAMPIÃO ERA DE ALAGOAS, E NÃO TERIA DIREITO À RECOMPENSA, SEM CONTAR QUE A REFERIDA RECOMPENSA PODERIA NÃO MAIS ESTAR VIGORANDO. O TEXTO SUGERE QUE O PRÊMIO NÃO FOI PAGO POR CONTA DA FARSA. ENTÃO PORQUE JOÃO BEZERRA E SEUS COMANDADOS FORAM PROMOVIDOS DE PATENTE E PREMIADOS COM UMA QUANTIA EM DINHEIRO PELO GOVERNO DE ALAGOAS?

TAMBÉM SOBRE O CERCO REALIZADO EM ANGICOS: CERCO NA FORMA GEOMÉTRICA DA PALAVRA (CÍRCULO), NÃO EXISTE JAMAIS EM SE TRATANDO DE COMBATE BÉLICO, POIS TERÍAMOS UM FESTIVAL DE FOGO CRUZADO COM DIVERSOS MILITARES FERIDOS OU MORTOS.

E OUTRA: QUAL O NOME DO MILITAR QUE DISSE QUE A POLÍCIA FOI INTERMEDIÁRIA DAS ARMAS E MUNIÇÕES ADQUIRIDAS POR LAMPIÃO?

MORRERAM ONZE CANGACEIROS! ONZE! PODERIAM SER MIL, MAS MORRERAM ONZE! SÃO ONZE VALENTES HOMENS INCLUINDO SEU REI. ALGUÉM ACHA QUE OS VOLANTEANOS IRIAM CORRER DESESPERADAMENTE ATRÁS DOS OUTROS QUE CONSEGUIRAM FUGIR? TODOS ESTAVAM DESLUMBRADOS COM LAMPIÃO, MARIA BONITA E MAIS NOVE CANGACEIROS! NÃO FOI POR COVARDIA DE JOÃO BEZERRA. ABSURDO!

LAMPIÃO ERA DESCONFIADO ATÉ DE SUA PRÓPRIA SOMBRA: COMO, SENDO ALERTADO SOBRE A HIPÓTESE DE ENVENENAMENTO, IRIA ELE PERSISTIR NA DÚVIDA?

PORQUE JOÃO BEZERRA É UM TRAIDOR? ELE CUMPRIU A MISSÃO! SE FOI POR TIROS OU (COMO SUGERIDO) POR ENVENENAMENTO, O SERVIÇO FOI FEITO. LAMPIÃO ESTÁ MORTO, NÃO ESTÁ?

SÃO MILHARES DE HISTÓRIAS RESURGENTES SOBRE O TEMA, MAS MESMO QUEM SAIU DE LÁ VIVO, NÃO VAI CONTAR NADA QUE O DESABONE, QUE FIRA SEU ORGULHO. EM ANGICOS HOUVERAM HEROIS E VILÕES EM AMBOS OS LADOS.

NÃO PODEMOS DEIXAR NOSSO PRECONCEITO COM AS FORÇAS PÚBLICAS TOMAREM CONTA DE NOSSO RACIOCÍNIO SOBRE TEMAS POLÊMICOS.

AS ÉPOCAS MUDAM, O CONTEXTO É O MESMO. PARABÉNS LAMPIÃO, PARABÉNS JOÃO BEZERRA E PARABÉNS SEVERO!

José Mendes Pereira disse...

Amigo Manoel Severo:

Este texto, o escritor Paulo Medeiros Gastão havia o escondido no seu acervo, talvez.
Mas em 2009, eu fui removido de uma escola para outra, aguardando a aposentadoria, e como eu já caminhava para ser inativo, não me deram sala de aula (que felicidade!), colocaram-me na biblioteca.
Incomodado, li uma porção de livros, que depois encontrei este trabalho do escritor. O que fiz? Copiei-o e hoje nós o temos em nossos blogs.

José Mendes Pereira – Mossoró-RN..

Anônimo disse...

Caro amigo Paulo Gastão gostaria de parabenizá-lo pelo texto. E concordo com você e com outros amigos a exemplo de Aderbal Nogueira que o episódio de Angico apenas está começando a ser revelado , muito se escreveu sobre o período de 23 a 28 de julho de 1938,mas ainda hoje não temos um veredicto e talvez nunca tenhamos pois Angico é o maior mistério da História do Cangaço e precisamos estarmos atentos com a verdadeira História.Por esses motivos comungo com o nobre amigo Paulo Gastão, façamos uma visita e pesquisemos a fundo antes de emitir qualquer veridicto. JAIRO LUIZ OLIVEIRA - PIRANHAS -ALAGOAS.