Existia amor no Cangaço ? Por:Juliana Ischiara

Juliana Ischiara

O fato de os cangaceiros não serem carinhosos com suas companheiras não é parâmetro para analisar se havia ou não afeto ou amor por parte deles. Sabemos que, àquela época, demonstração de afeto em público, como beijos e abraços, não era comum. As mulheres eram criadas para procriar, cuidar do marido e dos filhos. Já aos homens, cabia prover o sustento e o bem estar, cuidado e proteção da sua família.

Partindo desta premissa, não se podia esperar de um homem rude, marginalizado e vivendo sobre o jugo da violência, da brutalidade e da luta pela sobrevivência, que este agisse com urbanidade em tempo integral. Como disse João de Sousa Lima, os depoimentos de Adília e Sila, são impressões isoladas. O fato de Zé Sereno e Canário não serem “bons maridos”, não é suficiente para se generalizar que não havia afetividade dentro do cangaço. Sabemos que Maria Bonita*, embora vez por outra brigasse com Lampião,  chegava a gritar e a xingá-lo e, mesmo assim, ele não a agredia. Todos sabem do carinho que havia entre eles e, como citou João de Sousa, ainda temos casais como Durvinha e Virginio, Corisco  e Dadá. 

Maria e Virgulino, "amor" eternizado também na televisão...

Ainda temos o fato de Luiz Pedro, que depois da morte de sua companheira Nene, não voltou a se amasiar com outra mulher. Um outro caso é o de Pancada e sua companheira Maria, que mesmo sabendo das relações extraconjugais da companheira, não a matou, nem a deixou. Por fim, ainda temos o valente cangaceiro Gato, que morreu quando tentava salvar sua Inacinha, que havia sido capturada. Como vemos, havia muito mais demonstração de amor e afeto, que o contrário.

Que estas mulheres viviam em condições subumanas ninguém discorda. Muitas devem ter se arrependido de ter seguido o que, para elas, era uma possibilidade de liberdade, aventura e desejo de viver um grande amor, mesmo que bandido. Já as que foram seqüestradas, arrastadas, forçadas, algumas como Dadá, se adaptaram muito bem àquela vida e amavam seus companheiros. Outras tiveram a oportunidade de fugir e não o fizeram.

Em síntese, não se pode dizer que não havia amor no cangaço, pelo fato de um cangaceiro não ter beijado sua companheira ou ter sido agressivo com a mesma, haja visto que, ainda nos dias atuais, muitas mulheres se casam por amor e depois descobrem em seus maridos verdadeiros algozes. Milhares de mulheres são agredidas e têm suas vidas ceifadas por seus maridos que antes lhes pareciam príncipes encantados. Se, mesmo depois de toda a evolução socioeducacional e da ascensão do universo feminino, ainda foi necessário a criação de uma lei que a tutelasse da violência doméstica, imaginem há mais 70 anos atrás.

Juliana Ischiara
Diretora do GECC
Conselheira Cariri Cangaço

9 comentários:

Lima Verde disse...

Professora Juliana, como sempre somos presenteados pelo Severo quando temos sua participação nesse blog, texto primoroso .

Fernando

Karla Renata disse...

O enfoque da professora Juliana mostra outras facetas que não as já comentadas anteriormente pelos colegas; na verdade, a análise de um sentimento tão subjetivo e cheio e nuances, até para quem o vive, já é um desafio, dirá , analisar o amor no cangaço. Parabens Juliana e Cariri Cangaço e todos os que participam do debate.

Karla

Aventurando-se na História e histórias disse...

Minha amiga Juliana,

Como sempre nos presenteando com as suas reflexões coerentes e enriquecedoras. Concordo em gênero, número e grau.

Abraço fraterno e saudações cangaceiras!

Prof. Ms. Wescley Rodrigues
Cajazeiras - PB

Anônimo disse...

Pessoal o que me chamou a atenção nesse artigo da professora Juliana foi a palavra AFETO, talvez essa palavra seria mais apropriada ?

Ana Paula, Paulinha

Anônimo disse...

Esse último paragráfo do texto de Juliana é ameaçador.
Essas mulheres estão colocando os homens contra a parede. Já somos minoria na sociedade, a deserção da espécie é crescente, com essa campanha opressora que até Juliana está praticando... em pouco tempo não vai existir mais representantes masculinos ortodoxos da raça humana.
Salve-se quem puder!
C Eduardo

Anônimo disse...

Juliana,

Esse seu texto discorrendo sobre se havia amor ou não no cangaço é primoroso. Tem a sua marca. Tem a força de sua sensibilidade.

Vamos, todos nós, parabenisar o nosso Severo pela inspiração que teve em despertar em todos os vaqueiros da história essa tão gostosa e elogiável discussão.

Seria maravilhoso, minha querida filha, se Severo também fizesse com que os nossos queridos companheiros, cada um deles, mostrasse através de artigos um testemunho verdadeiro sobre tudo que aconteceu na Grota de Angico, excluindo, é claro, a verdade da morte de Lampião. Juro que eu daria um prémio a quem encontrasse uma só verdade dentro dos testemunhos dos que estavam em Angico.

Não digo nada a Severo porque ele tem medo das mentiras e mistérios de Angico, como o diabo tem medo da cruz rsrsrsrs

Abraços, minha amada filha

Alcino Alves Costa
O Caipira de Poço Redondo

Juliana Ischiara disse...

Caros amigos Lima Verde, Karla Renata, Wescley e AnaPaula, muitíssimo obrigada pelas palavras gentis e incentivadoras. Espero que minhas pesquisas e estudos me direcionem sempre pelo caminho da razão, do lógico, porém, sem perder o toque sutil da sensibilidade feminina

Amigo Carlos Eduardo, por enquanto foi só uma aviso...rsrsrsrs, mas, falando sério, sou mesmo militante, luto para que as mulheres sejam cada vez mais ativas e ocupem cada vez mais seus espaços, além de incentivá-las a não terem medo de buscarem seus direitos e não aceitarem nenhuma espécie de agressão e ou violência, seja física, moral, psicológica e econômica, conforme preceitua a Lei 11.349, conhecida como Lei Maria da Penha, que tutela a mulher no que concerne os diversos tipos de violência doméstica. Por isso seu “cabra” cuidado!!! Rsrsrsrsrs

Querido mestre Alcino, assim não vale... Com um pai assim, vou acabar me sentindo super, hiper, mega...rsrsrsrs obrigada meu querido anjo, meu amor.

Saudações Cangaceiras

Juliana Ischiara

Teresa Raquel disse...

Alguém sabe o email da Juliana?

Teresa Raquel disse...

Agradeço à Juliana por ter me revelado em São José do Belmonte-Pernambuco o nome verdadeiro de Sila: Ermecila São Mateus kkkk pra quem era Ilda Ribeiro de Sousa