Os Jesuítas e a Igreja mais Antiga do Ceará: Igreja de Nossa Senhora da Assunção em Viçosa do Ceará

Igreja Matriz de Nossa Senhora da Assunção, em Viçosa do Ceará, a primeira igreja construída em território cearense.

Subimos a serra da Ibiapaba, saindo de Sobral pela BR 222 e depois a CE 187, cerca de 120km e chegamos a Viçosa do Ceará. Eram mais ou menos 15h daquela segunda feira 27 de outubro de 2025 e o clima que veio mudando a medida que subíamos a chapada nos recebeu com amenos 19ºC. A partir de seu Portal de Entrada e passando por suas ruas de casinhas geminadas e coloridas, grandes e pequenas, sua praças e monumentos, fomos apresentados a essa cidade absolutamente encantadora, com tombamento federal de seu sítio histórico urbano, realizado pelo IPHAN em 2003.

Praça Clóvis Beviláqua em Viçosa do Ceará

Chegando à praça Clóvis Beviláqua, um conjunto precioso de edificações vamos encontrar edifícios históricos, públicos, institucionais, religiosos e residenciais; como o palacete da Casa Paroquial, o Palácio da Cidade onde funciona a prefeitura municipal, o Palácio Monsenhor Carneiro que é sede da Câmara Municipal, hotéis e palacetes residenciais  aí chegamos a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Assunção, simplesmente a primeira igreja construída em território cearense.

Viçosa, no estremo norte do estado do Ceará

Viçosa do Ceara, tombada pelo Patrimônio Histórico. foi o primeiro povoamento português na Serra da Ibiapaba; era habitada por indígenas da nação Aconguaçús, predominantes por esses lados da serra sem falar da grande nação Tabajara os "Senhores da Serra", além de outras etnias. Ali ocorreram os primeiros contatos com os colonizadores europeus; primeiro os franceses que inclusive criaram a "Feitoria da Ibiapaba" ainda pelos idos de 1590, ali já mantinham comercio e escambo com os índios com destaque para o Cacique Irapuã; Mel Redondo; que mantinha suas aldeias entre a atual Tianguá e Viçosa. 

Tailene Barros na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Assunção
Tailene Barros na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Assunção

De imediato a Matriz de Nossa Senhora da Assunção, de estilo barroco,  chama a atenção por sua beleza ímpar, com suas linhas retas e imponentes se destacando numa leve elevação contígua a própria praça. Vamos recorrer ao site oficial da prefeitura de Viçosa do Ceara para trazer um pouco da história desta extraordinária igreja: "A Igreja Matriz de Viçosa do Ceará foi construída pelos Jesuítas no último lustro do século XVII. Em carta datada de 25 de julho de 1697, dirigida ao Pe. Ascenso Gago informava: "para o verão seguinte, se Deus nos der mantimentos, se fará a (...) igreja em forma, para a qual se vai tirando a madeira necessária". 

"Em 1700, ano em que foi fundada a Aldeia da Ibiapaba, "concluiu-se a igreja, que já estava principiada antes, formosa e grande. Pequena, ainda assim, para tanta gente como ia ter a aldeias. As madeiras da serra, menos compridas do que se requeriam, não permitiam mais grandeza". E a 15 de agosto daquele ano "veio à inauguração da igreja. Colocou-se nela a imagem da soberana Virgem Senhora Nossa da Assunção. Procissão, missa, prática aos índios e, para maior pompa, o batismo solene de vinte e cinco catecúmenos."

Tailene Barros e Manoel Severo na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Assunção

A Arquitetura interna segue a praxe ate hoje observada nos templos católicos; uma nave nave central que nos leva até o altar e aso lados naves laterais ladeadas de imagens e adereços fixados nas paredes grossas e históricas. "O acesso faz-se pelas três portas da frente mencionadas, penetrando-se sob um coro alto, cuja largura é igual à da nave central e cujo piso é sustentado por viga que descarrega sobre duas colunas. Na cabeceira da nave central, situa-se a capela-mor, por sua vez ladeada por dois compartimentos que dão continuidade às naves laterais e a própria capela-mor, por meio dos arcos." 

"Da entrada da matriz até o início da capela principal do altar-mór, 25,35 m de comprimento por 8,80 m de largura constituindo da nave, como nos lados, seis arcadas altas com acesso aos corredores laterais. Logo na entrada, acima, avista-se sobreposto o coro em madeira na extensão da nave central, assim como toda o guarda-pó em madeira com suportes em tesoura. A capela-mor possui 6,82 m de largura por 9 m de comprimento. É esse espaço o mais antigo e de onde teve início toda a grande matriz. Do nível do piso a 0,73 cm chega-se à mesa do altar-mor por quatro degraus de madeira."


"Este antigo altar de madeira de 2,35 m de comprimento por 0,99 cm de largura é torneado até a base; sobressai-se ao retábulo-mor de madeira que possui quatro ninchos que abrigam imagem dos santos, dois encimados de cada lado do camarim com o trono da imagem de Nossa Senhora da Assunção. Todo o retábulo-mor, ornado em alto relevo, impressiona pelos elementos decorativos. Acervo da arte barroca luso-brasileira é no altar-mor e nas pinturas dos paineis do forro da Igreja, onde podem ser apreciadas as relíquias artísticas. Verdadeiras preciosidades anônimas, uma vez que não existem registros históricos que indiquem o nome ou origem do artista responsável pela obra. Pelo grau de refinamento, pesquisadores acreditam tratar-se de alguém que conheceu profundamente o cenário artístico mundial. Os painéis do forro expressam uma série de virtudes cristãs e sentidos humanos, elementos tradicionais da pintura barroca, e traços que montam a arte chinesa, expressos nas faces das figuras. Além disso, o artista ousou inserir elementos da flora e da fauna local. Os painéis da Igeja da Assunção foram assim identificados: Virtudes Teologais - três painéis (Esperança, Fé e Caridade); Virtudes Cardeais ou Morais: (Justiça, Prudência Fortaleza e Temperança); e os Painéis dos Sentidos Humanos: (Tao, Visão, Audição, Paladar e Olfato). Segundo ainda Prof. Liberal de Castro "os painéis da Igreja Matriz constituem de certo modo, se não a única, mas sem dúvida a mais importante realização da arte barroca no Ceará, tratando-se de obra inquestionável significação no acervo artístico nacional"

 "Com uma vasta obra literária, Padre Antônio Vieira foi um dos jesuítas da Companhia de Jesus no Brasil no século 17. Passou boa parte da vida no que, hoje, é o estado do Maranhão. De lá, foi em missões ao Ceará, fundando a Missão Jesuítica da Ibiapaba em 1655,  que visava catequizar os indígenas locais, especialmente os Tabajaras, e se opôs à "República de Cambressive" liderada por Antônio Paraupaba. Essa missão, sediada na atual Viçosa do Ceará, foi extinta em 1758 pelo Marquês de Pombal, mas deixou um legado importante documentado na obra de Vieira, como a "Relação da Missão da Serra de Ibiapaba.

 A Igreja Matriz de Nossa Senhora da Assunção, em Viçosa do Ceará, teve sua fundação originada pelo padre e guarda traços dessa passagem. Vieira ganhou notoriedade com os seus sermões e cartas, se destacou na política e ficou marcado na História como o grande defensor dos povos indígenas no período colonial.

Antônio Paraupaba (c. 1595–1656) foi um dos mais importantes líderes potiguara do século XVII, cuja trajetória atravessou oceanos e fronteiras coloniais. Filho de Gaspar Paraupaba, nasceu na Capitania da Paraíba em meados do final do século XVI, numa época marcada por intensos confrontos entre portugueses, holandeses e povos indígenas do Nordeste. 


"Os Jesuítas chegaram ao Ceará enviados por Portugal, por volta da metade do século XVII, com o objetivo de evangelizar os nativos, que havia se tornado hostis à medida que criadores de gado exploravam os sertões.  A ação catequizadora dos jesuítas na metade do século XVII diferia das práticas iniciais. A princípio os membros da Companhia de Jesus procuravam evangelizar os índios de forma espontânea, com danças, procissões, presentes, cantos e pregações, visitando-os e convivendo com eles por certo período nas aldeias.  Essa estratégia não deu certo. Bastavam os padres deixarem as aldeias para que os indígenas retomassem seus costumes tradicionais. Antes vistos como doces e inocentes, os índios passaram a serem considerados seres bestiais, animalescos, endemoniados. Para convencê-los a aceitar a fé cristã, seria necessário, antes de tudo, dominá-los e afastá-los de seus hábitos primitivos, dos pajés, feiticeiros, e curandeiros. Os aldeamentos ou missões eram áreas em que se erguiam espécies de aldeias artificiais, ambiente diferente das aldeias naturais dos nativos, para onde os índios eram conduzidos e mantidos para serem doutrinados. Criavam-se os aldeamentos a partir da concessão pelo governo de terras necessárias à sobrevivência dos índios que visavam catequizar. 

A Carta Régia de 1700 estabeleceu a dimensão de uma légua quadrada de terra para os aldeamentos. Durante anos os jesuítas tentaram inutilmente fundar aldeamentos estáveis na Ibiapaba, local onde os índios se opunham ferozmente à presença dos invasores. Várias vezes os jesuítas foram obrigados a deixar a serra, fosse por resistência dos índios, fosse por pressão dos colonos e autoridades d Maranhão, os quais desejavam escravizar os nativos. Por fim, em 1695, os religiosos conseguiram se instalar na serra, fundando em 1700 o aldeamento de Nossa Senhora de Assunção da Ibiapaba, no local da atual cidade de Viçosa do Ceará. Já em 1702 a Aldeia da Ibiapaba já abrigava mais de quatro mil pessoas, o que a tornava um aldeamento de dimensões consideráveis. Na primeira metade do século XVIII a Missão da Ibiapaba se tornara o maior aldeamento do Brasil. Para dar uma base de sustentação econômica à aldeia, o governo português determinou a entrega de sesmarias aos religiosos onde pudessem criar gado. Assim, recebendo como doação ou comprando terras, os jesuítas se tornaram proprietários de vastos latifúndios, possuindo terras nas proximidades dos rios Jaguaribe, Choró, Pacoti, Aracatiaçu e Coreaú. " 

Visita do Cariri Cangaço a Serra da Ibiapaba
Viçosa do Ceará, 27 de outubro de 2025

Nenhum comentário: