Lamartine e o Tiro que Matou Lampião...


Lamartine Lima entre os Conselheiros do Cariri Cangaço, Juliana Pereira, 
João de Sousa e Manoel Severo

Transcrevemos depoimento do pesquisador e médico, Lamartine Lima a cerca da palestra do Conselheiro Cariri Cangaço, Ivanildo Silva por ocasião do Cariri Cangaço 10 Anos na cidade de Juazeiro do Norte no Ceará com o tema:"O tiro que matou Lampião".

"Meu caro Ivanildo, parabenizo-lhe pelo seu muito bem pesquisado trabalho que resultou na cuidadosa, minudente e substancial conferência “O tiro que matou Lampião”, por você proferida no dia 25 de julho de 2019, às vésperas do 81 aniversário da morte daquele chefe cangaceiro. Como você sabe, passei 25 anos vinculado ao meu Mestre Estácio de Lima, que me preparou e nomeou Médico Legista do Instituto Nina Rodrigues, que o fui durante 30 anos, em consequência do que também fui seu Assistente nas suas quatro Cátedras de Medicina Legal - Faculdade de Medicina da Bahia da UFBA, Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, Faculdade de Direito da UFBA e Escola de Formação de Oficiais da Polícia Militar do Estado da Bahia - antes havendo sido universitário voluntário guia do Museu Estácio de Lima daquela instituição. 

Mesmo antes das cabeças dos sete cangaceiros - Lampeão, Maria Bonita, Corisco, Azulão, Zabelê, Canjica e Maria de Azulão - terem sido colocadas no museu, eu as conheci no gabinete vizinho da Sala Oscar Freire, de autópsias do antigo Nina, onde trabalhava o embalsamador de todas elas, o francês Dr. Charles René Pittex, com quem depois eu laboraria durante uma década. Estudei todas aquelas cabeças, antes e depois de sepultadas, no intervalo de trinta anos, e apenas Lampeão e Canjica haviam recebido tiro no crânio, em combates diferentes. 

Eu havia estado acompanhando o Prof. Estácio e sua futura sucessora Profa. Maria Theresa Pacheco em viagem de estudos pela Europa durante três meses do ano de 1973, quando tivemos a oportunidade de conhecer bem, através do Prof. Césare Gerini, o Gabinete do Prof. Césare Lombroso, de quem aquele era o quarto sucessor na Cátedra de Medicina Legal da Universidade de Turim, onde estavam guardadas, junto com a cabeça do próprio Lombroso, outras partes corpóreas dele e muitos cérebros de criminosos por ele estudados, mas sobretudo chamava-me a atenção o crânio do famoso assassino Giuseppe Villela, em que Lombroso identificara a anormal fosseta mediana occipital (regressão anatômica), à qual aquele célebre homem de gênio atribuía o grave desvio comportamental e criminal de Villela. 

Pensamos em procurá-la em Lampeão. Acontece que o tiro que o famoso cangaceiro recebera na região fronto-parietal direita e produzira ampla fratura craniana, deformara a sua cabeça e, ainda em Alagoas, o Dr. Lages Filho a recompusera ajustando e suturando os tecidos moles cefálicos, o que foi reforçado depois pelo Dr. Pittex. Assim, o Prof. Estácio, e mais tarde eu também, estudaria através de Raios X o endocrânio do bandido nordestino, sem muitas conclusões. 

Conselheiro Cariri Cangaço, Ivanildo Silva por ocasião do Cariri Cangaço 10 Anos

Há muitos anos, quando eu era Secretário Geral do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, estive com o Dr. Jaime de Altavila Filho, Presidente do Instituto Histórico de Alagoas, que me mostrou aqueles objetos, o punhal e a cartucheira de Lampeão, com as evidências dos tiros que receberá no tronco. Depois que Mestre Estácio se aposentou, o seu despeitado sucessor no Nina mandou fechar o museu e sepultar todas as cabeças. Só 30 anos depois disso, no início deste século XXI, quando as descendentes de Lampeão e Maria Bonita me pediram para conseguir a exumação das cabeças, e eu a fiz, pude encontrar sem as partes moles e exposto o crânio fraturado de Virgulino Ferreira da Silva, tendo o osso occipital indene e absolutamente normal. A sua conferência enriquece bastante o décimo ano do Cariri Cangaço e engrandece a academia de estudos cangaceiros." 

Muito agradecido, amplo e firme abraço do velho amigo
Lamartine".

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