Lampião em Capela Por: Ivanildo Silveira




A literatura cangaceirista narra, com uma grande riqueza de detalhes, a visita de Lampião á cidade de Capela, distando esse município, apenas 70 kms de Aracaju, capital do estado de Sergipe. A visita indesejável ocorreu no dia 25-11-1929.



Após visitar e fazer escaramuças na cidade sergipana de Nossa Senhora das Dores/SE, o rei vesgo do cangaço, se apropiou de alguns poucos veículos existentes nesse lugarejo, e junto com sua malta, algo em torno de 15 cangaceiros, se dirigiu á cidade de Capela.

Ao se aproximar dessa útima urbe, o rei caolho do cangaço mandou emissário ao então intendente (cargo de Prefeito), Sr. Antão Correia Andrade, conhecido por "Correinha", com o seguinte recado:

diga ao major Correinha (irmão do Chefe de Polícia/SE - Dr. Heribaldo Dantas Vieira) que se quizé qui eu entre em paz venha até aqui, se não vié eu entro com bala e a rapaziada ".



Em seguida, partiu o emissário, voltando em companhia do intendente.
Após confabulações com seu interlocutor, Lampião entrou na cidade de Capela/SE, por volta das 20:00 hs, antes, porém, mandou cortar os fios de comunicação.

Os cangaceiros do estado-maior de Virgulino: Moderno, Ezequiel, Arvoredo, Volta Seca, Mourão, Gavião, Jose Baiano e outros valentes, tomaram posição, em pontos estratégicos.

Cine Capela; foto acervo Dr. Sérgio Dantas

Lampião foi até o " Cinema Municipal de Capela " (foto acima), acompanhado de alguns cabras, e do intendente (prefeito ). Ao chegarem no local, foi grande o alarido, tendo os espectadores sido dominados pelo pavor, impossibilitados de fugir. Na ocasião estava sendo veiculado o filme "Anjo das Ruas", com a artista Janet Gaynon. A projeção foi interrompida. O rei do cangao advertiu a todos que não corressem. Era um cinema simples, com banda de música que tocava no intervalo. Os músicos tocaram com beiços trêmulos, uma valsa triste e desafinada.

Na sala de projeção, avista-se o telegrafista Zózimo Lima, e previne-lhe de que não dê notícia de sua entrada na cidade, sob pena de ser sangrado.


Do cinema, Lampião sempre acompanhado do intendente (prefeito), e do telegrafista Zózimo foi até a estação da estrada de ferro, utilizando 3 automóveis, dos 4 tomados em Nossa Senhora da Dores.



Com a chegado do trem, os passageiros começaram a saltar, calmos. Ao saberem da presenca do rei do cangaço, o desembarque se transformou numa debandada. Um soldado que vinha de Aracaju, foi abordado por Lampião, que arrebatou-lhe o fuzil, tirou as balas e deisse que ele tinha sorte, pois se fosse da polícia baiana, o sangraria, ali mesmo.


Como contribuição, o caolho do cangaço estabeleceu que a cidade contribuiria com a importância de 20 contos de réis. O prefeito, no entando, salientou que os habitantes de Capela eram pobres, se achavam desprevenidos, estavam atravessando 3 anos de seca. Nisso, foi atendendido, tendo a importância sido reduzida para 06 contos de réis. O próprio chefe de polícia (delegado), Pedro Rocha quem fez a coleta entre os que dspunham de posse. Entregue ao cangaceiro Moderno, esse colocou o montante no bolso, sem contar.




O chefe do cangaço deu ordens a seus subordinados para que andassem livremente pela cidade, mas que ficassem atentos ao apito para a retirada estratégica. Na loja do comerciante Jacson Alves de Carvalho, Lampião adquiriu roupa, capa de borracha e um parabelo , tendo dito o seguinte:"Eu carrego comigo treiz coisas: corage, dinheiro e bala".


Por onde andavam os cangaceiros eram acompanhados de uma grande legião de admiradores, encantados com as histórias de suas façanhas e vestimentas esquisitas.

Por seu turno, o padre José Cabral esteve com os delinquentes que a ele se curvaram pedindo benção. Foram aconselhados a deixarem aquela vida.

Lampião recebeu das mãos do comerciante Jackson Alves Carvalho, com dedicatória, o livro "Vida de Cristo ".


Cerca das 23:00 horas, Lampião desejou telefonar para o chefe de polícia da capital (Aracaju), Sr. Heribaldo Vieira. A ligação não pôde ser completada, em face do adiantado da hora.


Dr. Ivanildo Silveira e Kiko Monteiro

Lampião desejou conhecer o "brega" (cabaré) de Capela, pois essa cidade gozava da fama de ter mulheres decaídas bonitas em abundância. Ele foi recebido pela prostituta " ENEDINA ", a quem obsequiou, após o " COITO " , com 70 mil réis. Enquanto vadiava, 02 cangaceiros davam guarda á entrada e saída do lupanar.

No salão de bilhar (jogo) situado na Praça do Mercado, o Rei Vesgo do Cangaço, deixou, em uma de das paredes, o seguinte aviso:


Capela - 25-11-29
Salvi

Eu cap.m Virgolino Ferreira

Lampeão

deixo Esta Lca. para o officiá qui parçar

Em minha perceguição, apois tenho Gosto que
Voceis me persigam. Descupe as letra qui sou
Um bandido como voceis me chama pois eu não
Mereço, Bandido E voceis que andam roubando
e deflorando as famia aleia porem eu não tenho
este costume todos me desculpe a gente a quem odiar ?
Aceite Lças. do meu irmão Ezequiel Vulto Ponto Fino e
do meu cunhado Virginho Vulgo Moderno.



Por volta das 03 horas da madrugada, Lampião convocou os demais cangaceiros, com 3 silvos de apito, tendo deixado Capela, nas mesmas viaturas em que haviam chegado.




No caminho, trocaram os automóveis por cavalos.


A políca sergipana, na capital, havia sido avisada, mas não conseguiu chegar a Capela, senão às 07 hs da manhã do dia seguinte.




Um abraço a todos.


IVANILDO SILVEIRA


Colecionador do cangaço


Natal/RN


Gentileza: lampiaoaceso.blogspot.com
Kiko Monteiro

5 comentários:

Anônimo disse...

Prezado senhor Ivanildo e SEvero, lendo a literatura sobre a atuação de Lampião em sergipe, e o artigo em tela, confirma o que digo, me vem a ideía de um nordeste do Brasil transportado para a época das capitanias hereditárias, quando a ausencia do poder público ou a inoperancia desse, destinavam pequenas cidades como capela à sanha dos bandos cangaceiros. por isso digo que lampião foi um bandido diferente até neste aspecto.

Anônimo disse...

Concluindo: o papel das elites de então, os coroneis de plantão, como o proprio Eronildes de Carvalho, foram os grandes responsáveis por episodios como esses.

Sergio Monteiro - Fortaleza

Honório de Medeiros disse...

Excelentes os trabalhos de Mestre Ivanildo.

Nosso querido "Colecionador", cada dia que passa, se revela, isso sim, como grande cronista do cangaço.

Honório de Medeiros

Anônimo disse...

Grande colecionador/escritor Ivanildo, você sempre muito preciso nos seus textos. As informações nunca deixam nada por dizer ou dúvida sobre os fatos. Vejam a riqueza de detalhes: “Lampião desejou conhecer o "brega" (cabaré) de Capela, pois essa cidade gozava da fama de ter mulheres decaídas bonitas em abundância. Ele foi recebido pela prostituta " ENEDINA ", a quem obsequiou, após o " COITO " , com 70 mil réis. Enquanto vadiava, 02 cangaceiros davam guarda á entrada e saída do lupanar.”
Parece que já tem um grupo de “pesquisadores sérios” organizando uma diligência ao estabelecimento citado no seu artigo, para conferir a boa reputação da casa. Afinal de contas a pesquisa de campo vai confirmar o dado bibliográfico.

O blog Cariri Cangaço é um ponto de encontro muito interessante e agradável dessa turma divertida de apreciadores da história do cangaço.

Um abraço aos amigos.
Carlos Eduardo Gomes.

José Mendes Pereira disse...

Amigo Severo:

Qualquer história sobre Lampião, contada pelo o Dr. Ivanildo Alves da Silveira, é sempre bem-vinda a nós estudantes do cangaço.

Valeu!

José Mendes Pereira - Mossoró-RN.