Entardecer na cidade de Piranhas, Alagoas
Aproxima-se mais um aniversário da morte de Virgulino Ferreira da Silva, o maior bandoleiro da América Latina. Turistas do Brasil e de outros países chegam às margens e barrancos do “Velho Chico” e se destinam ao porto da Forquilha. Dali a multidão segue para o célebre riacho, abarrotando a veredinha de pessoas ávidas por conhecer o lendário local onde aconteceu o fim de Lampião, Maria Bonita e mais nove de seus companheiros, além da derrocada final do cangaço nordestino; grande flagelo que desgraçou a vida dos povos interioranos de sete estados brasileiros.
Piranhas, nas Alagoas, Canindé de São Francisco e Poço Redondo, em Sergipe, procuram, na medida do possível, prestigiar esse tão esperado dia com palestras, encontros e missas. Tudo muito bonito. Tudo muito merecido. Os turistas se aglomeram em volta e pelo meio do riacho, sentados nos barrancos e nas pedras, para assistir o culto religioso onde um padre, todo paramentado, discorre em seu sermão a magnitude daquela data. Contudo, precisa-se, urgentemente, que se faça à última e definitiva tentativa de não eternizar as grandiosas mentiras que se tornaram verdades da Grota de Angico.
Sabemos perfeitamente que tudo que se relaciona com aquele fatídico combate à inteligência humana é incapaz de compreender ou explicar. Ali em Angico, o rei cego, numa trama genial e fabulosa, fincou o seu maior mistério, e com a finalidade única de estontear os caçadores de sua saga, deixou que se enraizassem grandes mentiras que mesmo com o passar dos anos ninguém as descobriu e nem jamais as descobrirá.
Angico, município de Poço Redondo, Sergipe
Fico deveras abismado com a inércia dos pesquisadores, historiadores e autoridades outras, que se deixaram envolver e acreditar nas mentiras de Angico. Fazendo assim, com que se perpetuem como verdadeiros os depoimentos sabidamente mentirosos e contraditórios dos que participaram, no teatro da luta, daquela hora final do homem das barrancas do riacho São Domingos e seus companheiros.
As atitudes e estratégias de Lampião estavam muito além de tudo aquilo que a inteligência humana é capaz – ou incapaz – de explicar ou compreender. Podendo-se afirmar que os labirintos criados pelo notável bandoleiro dos tabuleiros da Serra Vermelha se constituem num enigma que ninguém conseguiu descobri-lo com o passar dos anos. Inexplicavelmente a trama de Angico ficou oculta para todo o sempre.
Lampião, você é realmente um bravo, um herói invulgar. O homem brasileiro tem a obrigação de se curvar perante a sua sabedoria e aceitar que você, lá do Além, não se canse de gargalhar desdenhosamente da quase nenhuma inteligência de todos nós, pobres pecadores que não temos forças para enfrentarmos um mito de sua grandeza. Como se fosse um bruxo – e bruxo ele era – Lampião fez com que todos os que viveram a agonia de Angico ficassem envoltos em intermináveis contradições. Cada um, seguindo ditames diferentes e misteriosos, querendo contar os fatos conforme as suas próprias vontades, e assim, deixando aqueles que precisavam registrar o grandioso épico na mais completa desilusão.
Velho Chico; à margem esquerda: Piranhas; na direita: Poço Redondo
Os que viveram acompanharam e participaram daquele lendário instante da agonia e morte do cangaço nordestino, desde muito, estão ameaçados pelo avanço da idade. Os poucos que ainda vivem estão próximos, muito próximos, do ciclo final de suas vidas, escasseando, assim, os que se envolveram direta ou indiretamente naquela epopéia sertaneja.
E os mistérios que ali se eternizaram como é que ficam? Será que os pesquisadores e historiadores irão continuar fazendo pouco caso desses inexplicáveis fatos que cercam a Grota de Angico e assim deixar que os falsos depoimentos continuem com a auréola de verdade da História? Sou de opinião que ainda existem algumas pedras que não estão corretamente assentadas no tabuleiro da história do cerco e ataque de Angico. E eu não compreendo o porquê dos que vivem rastejando as pegadas históricas do homem do sertão de Pernambuco não sentirem o menor interesse em desvendar esses mistérios. E, ainda mais, fugir, “como o diabo foge da cruz”, quando se projeta em consertar as distorções gritantes que repousam nas páginas da literatura do cangaço, sem se falar na monumental má vontade de pelo menos se tentar desvendar algumas – eu disse algumas – das famosas fábulas de Angico. Algumas dessas fábulas me atormentam.
Vejam partes delas no próximo artigo.
Alcino Alves Costa
O Caipira de Poço Redondo
15 comentários:
Parabéns pelos brilhantes artigos amigo Alcino. Você sempre dedicado ao estudo da saga cangaceira. Abraços fraternos do seu grande admirador!
Prezado Severo.
Fico muito agradecido pela iniciativa,,,
sou da cidade de Potengi-Ce, fica a 90 km, da cidade do Crato....resido em Guarulhos cidade da Grande São Paulo há mais de 20 (vinte) anos;
sou Advogado e Gerente de RH, de uma empresa Nacional;;
não esqueço as minhas raizes, ou fontes,,, sempre vou ao Ceará,,,
Já estou bem radicado aqui em SP minha esposa é Paulistana temos 01 filha.....que por sinal adora o Crata juntamente com seus clubes, Arajara Park e Grangeiro...
Aqui em São Paulo existe uma grande colonia de Cearense,,, conheço bastante pessoas do Crato,Potengi e outros,,, tenho um colega que é delegado da polícia civil que é da mesma cidade de Potengi, juntamento com o filho que é delegado também, temos ainda aqui no tribunal de justiça de São Paulo alguns membros cearenses isso é muito bom...reside aqui também o meu irmão que é funcionário público;
Sobre o potengi tenho a declarar que meus Pais e minha irmã que por sinal estudou no crato, formada em letras reside ainda nesta cidade, de vez enquanto apareço por lá,,,,, agora está fácil aeroporto no Juazeiro, tempos atrás tinha que ir até fortaleza tomar ônibus até o Crato agora está muito bom.
Estamos aqui em Guarulos/São Paulo as suas ordens no que precisar,,,
Obs. Avise a sua esposa quando quiser vir a SP, ou precisar de algo nos procure...
sobre a cidade do Crato, lembro do Sr. Pedro Filicio, que tinha uma escola de contabilidade......alguns amigos da família Brasil,,,,,e outros
Elias Santos
Guarulhos
São Paulo
abraço
Elias
Os famosos mistérios e mentiras de Angico, o que temos visto é uma "batalha campal" entre as literaturas que nos trazem a história de que realmente houve o ataque, tiros e mortes em Angico e outra que coloca em dúvida o referido ocorrido, com ilações quanto a propensa ligação de João Bezerra com Lampião, a trama urdida pelos dois, a fuga do Rei do cangaço, enfim enfim enfim e ainda por cima o mais novo capítulo dessa verdadeira saga de Angico: o livro de um escritor de minas gerais que diz que Lampião morreu em Minas nos anos oitenta!!!!
Quem vai destar esse nó???
Antônio Fernando de Sá Pontes
Vitória ES
É realmente ainda hoje se tem notícia de mistérios como fala o Antonio de Vitória do ES, como explicar por exemplo a suposta ligação de João Bezerra, um respeitado militar pernambucano, quando dizem que vendia armas para Lampião, e depois o mesmo oficial se envolver em combate com o recebedor das mesmas armas????? Não cabe na cabeça de ninguém....
Esperemos o final desta matéria do grande escritor Alcino Costa, para alinharmos as idéias.
Marcos Assunção
Ter a idéia que um militar de renome como era o tenente Bezerra vendia armas para Lampião poucos dias antes de combater o bandido, é conversa pra boi dormir.
Tem um vídeo do cangaço que mostra a entrevista do irmão do Pedro Candida dizendo que tenente Bezerra mandara armas e munições para Lampião um ou dois antes do 28 de julho, mas, pelo amor de Deus,conversa fiada... concordo com Marcos Assunção, especulações que não param jamais.
Mesmo assim tenho que aplaudir o texto do autor Alcino de poço redondo.
Severo meu caro, divulgue logo a progamação toda rapza, quer matar todo mundo de curiosidade? Abraço do amigo
Yuri
Amigo Alcino
Aplicando a técnica de fazer suspense, de deixar no ar um gosto de quero mais.
Imagino que você possa, um dia, desvendar todos esses mistérios, pois, em algum lugar daquela gruta você vai encontrar a chave dos muitos mistérios que o estimulam a continuar estudando e ensinando sobre o cangaço.
Afinal, Lampião viveu seus últimos anos por essas bandas e você mora na querida Poço Redondo, da suposta despedida do "Rei Cego"
Abraços
Julio Cesar Ischiara
Prezado amigo Severo,
Gostaria de ter a oportunidade de resposta à matéria do nosso querido Alcino “Os Labirintos de Lampião” pois, as colocações que ele faz sobre Angico, expostas no livro dele fica para quem comprar a obra, mas, expostas no blog, requer um maior cuidado, pois desabona os participantes do combate, todos que já escreveram sobre o tema, como também as demais autoridades.
Um abraço fraterno
Paulo Britto
Prezados confrades.
Decorrido mais de 70 anos da morte do Rei do Cangaço, Nos é surpreendente quanto o tema ainda prende a atenção de todos.
Acredito, que o Cariri Cangaço de 2010 será palco de grandes debates. Portanto senhores, eis aí o lugar ideal para todas essas discursões.
Abraço para o Severo e toda equipe.
Assis Nascimento//Mossoró (Rn)
Caro Amigo Alcino. Parabéns pelo artigo. Mas, como você já sabe, não compartilho da profusão dos "mistérios" no combate do Angico. Os mistérios (oriundos dos desencontros de informações entre os circunstantes ao combate) decorrem da amnésia parcial alcoólica e do stress físico e emocional dos participantes. Aliás, o depoimento dos cangaceiros tende a ser muito mais fidedigno que o dos soldados, uma vez que estes últimos beberam até de manhã, enquanto que os cangaceiros foram dormir lá pelas 21-22h. Além do quê o fato de terem sido pegos de surpresa, fez com que tivesses uma "sobriedade" precoce - instinto de sobrevivência.
Ou seja: na minha opinião, Lampião morreu em decorrência da estratégia bem sucedida de Bezerra e Ferreira de Melo, apesar dos contratempos. As evidência mostram que não havia veneno (temos evidências de pelo menos 5 dos cangaceiros que morreram mostrando que estavam bem, sem sintomas de envenenamento, antes do tiroteio: Maria (indo buscar água), Lampião (tomando café com Vila Nova), Megulhão (conversando com Candeeiro), Enedina (correndo atrás de Sila), Luis Pedro (tentando varar o cerco no depoimento de Antonio Jacó). Então, as evidências apontam (até que alguém mostre evidências melhores dizendo o contrário) que Lampião, Maria e os outros morreram de bala, na madrugada de 28 de julho de 38.
Abraço
Leandro C. Fernandes
Caro Alcino. Parabéns pelo artigo. Mas como você sabe não compatilho da "profusão" de mistérios em Angico. Acho que os desencontros presentes nas circunstâncias do combate são frutos da amnésia parcial alcoólica e estress físico e emocional imposto aos soldados e cangaceiros, que emitem sua particular visão dos acontecimentos. Aliás o depoimento dos cangaceiros sobreviventes tende a ser mais fidedigno, pois foram dormir lá pelas 21-22h, enquanto que os soldados beberam a noite toda. Temos evidências de pelo menos 5 dos cangaceiros que morreram mostrando que estavam bem antes e durante o combate, tornando a hipótese do veneno improvável: Maria (andando, indo buscar água e conversando com Luis Pedro), Luis Pedro (tentando varar o cerco e conversando com Maria no depoimento de Antonio Jacó), Lampião (tomando café com Vila Nova), Megulhão (baleado e conversando com Candeeiro), Enedina (correndo atrá de Sila). Diante disso, só posso ver o Angico como uma estratégia bem sucedida peitada por Bezerra e Ferreira de Melo, que culminou com morte à bala de Lampião e Maria.
Grande abraço
Leandro Fernandes
E onde fica o depoimento de Durval Rosa, irmão de Pedro de Candida?
Kilombo
Olá, Alcino.
Primeiramente: parabéns pelo trabalho que realiza.
Li uma citação a um trabalho seu (Lampião Além da Versão. Mentiras e mistérios de Angicos), e gostaria de saber como obter um exemplar.
Desde já, grato
Fábio Menezes
fvmenezes@yahoo.com.br
Amigo escritor Alcindo Alves da Costa: Gostaria que o senhor por bondade, colocasse em um dos seus textos, uma foto do seu primo Zabelê, morto em 1933.
José Mendes Pereira - Mossoró- Rio Grande do Norte.
O que o escritor Alcindo fala sobre as possíveis mentiras que aconteceram na Grota de Angicos, tem sentido. E como tem. Se nós analisarmos cuidadosamente, veremos que não só Balão, como todos que deram as suas entrevistas aos repórteres, pesquisadores e escritores, fabricaram respostas falsas. Infelizmente não mais encontrei a fonte em que eu pesquisava, e que eu não deveria falar neste fato, quando Panta de Godoy disse a uma repórter que atirou em Maria Bonita pelas costas, e que o tiro foi mesmo na barriga. Ora! Se Maria Bonita seguia o seu trajeto de costas, como foi que o tiro foi mesmo na barriga? O amigo Balão disse à Revista Realidade: “Quando entrei (possivelmente no cangaço) Lampião tinha duzentos homens, separados em grupos para despistar as volantes. Muitos dos oficiais já tinham mulheres: Corisco, Luís Pedro, Pancada. No fim, até os cabras. Elas não lutavam“ O que é isso Balão!? Nunca li textos afirmando que Lampião chegou a ter um bando de duzentos homens de uma vez. Você diz que as mulheres não lutavam. Mas o que eu sei é que não todas, mas algumas participavam de todos os combates. E continua Balão: “Lampião andava todo furado de balas. Eu pensava: é oração, ele não morre mais”. Que má sorte de Lampião! Só ele recebia balas no corpo. Continua Balão: “Uma vez me perdi do bando e fiquei um ano nas caatingas de Bebedouro, Jeremoabo, Cipó de Leite, sem ver uma alma viva. No começo eu estava com ANJO ROQUE (o texto está assim) e sua mulher. Ele, porém, era ciumento e nos separamos. Fiquei só. Pensei em me entregar, mas seria morte certa. Vaguei pela caatinga como um porco-do-mato, comendo raiz de imbuzeiro, folhas e carne de bode. Do cipó de mucunã tirava a água: a gente corta, assopra e ela vai caindo, avermelhada, mas doce. Quem não conhece o truque morre de sede pisando na água”. Um ano separado do bando sem ver um pé de pessoa meu amigo Balão, em nossos Estados que não são tão grandes, são muitos dias. Como ele cozinhava a carne de bode, dentro da mata sem fósforo... E continua: “Uma vez, na FAZENDA CUIABÁ, ficamos oito dias e oito noites dançando” Oito dias e oito noites dançando são muitas horas. Continua: “Todos os cangaceiros usavam (perfume) e não economizavam. Madeira do Oriente e principalmente um chamado trina, que durava até seis meses no corpo. As volantes às vezes achavam o nosso rastro só pelo cheiro” Eu acredito que os cangaceiros usavam o perfume de fabricação Japonesa. (INHACAPURA).Em matéria de fantasia, o amigo Balão é um gênio.
Desejo aos confrades do Cariri cangaço e aos seus familiares: “UM FELIZ NATAL E PRÓSPERO ANO NOVO”.
José Mendes Pereira – Mossoró-Rn.
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Ah, Alcino Costa foi embora muito cedo
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