Padre Cícero Romão Batista
No primeiro domingo do dia 07 de julho de 1889, a igreja celebrava a solenidade do Preciosíssimo Sangue de Jesus Cristo. No amanhecer daquele dia, há exatos 131 anos, aconteceu a primeira romaria ao pequeno lugarejo do Joaseiro. Uma multidão de 3 mil pessoas caminhou nas veredas rumo ao vilarejo. A peregrinação foi organizada pelo Monsenhor Francisco Rodrigues Monteiro, reitor do Seminário de Crato. Pe. Cícero acolheu o seu irmão no sacerdócio e seus contemporâneos cratenses. Inesperadamente, o reitor do seminário do alto do púlpito, no meio daquela multidão, em voz alta no seu sermão explicou minuciosamente os acontecimentos do propenso milagre do derramamento de sangue na boca da beata Maria de Araújo. Na firmeza de sua convicção dos fatos ocorridos na capelinha da Mãe das Dores, ele tirou uma das toalhas manchadas de sangue e apresentou ao povo. Não titubeou em afirmar que era o sangue de Jesus Cristo, promovendo momento de júbilo, exaltação e lágrimas nos rostos dos presentes naquela celebração. O fato gerou preocupação, contrariedade e angústia no padre Cícero como revelou numa carta ao senhor bispo do Ceará: “Quando eu soube disto, fiquei para morrer de vexame; desejei sumir-me pelo chão adentro, de angustiado”.
O que significa e representa esse acontecimento na vida do Padre Cícero e na história de Juazeiro? Primeiramente, a quebra do silêncio dos fatos extraordinários ocorridos naquele 01 de março de 1889 do fenômeno da hóstia sagrada. O anúncio público não foi feito pelos protagonistas dos fatos milagrosos do Joaseiro, mas por uma autoridade eclesiástica de reconhecida qualificação e portador de profundos conhecimentos teológicos. Afinal, era o reitor do Seminário de uma sólida formação filosófica e teológica.
A proclamação dos fatos precede de uma romaria da cidade de Crato à vila do Joaseiro. A romaria é um fenômeno universal e presente em todas as religiões. É a experiência de deixar sua terra em busca do “lugar santo”. Os devotos que vieram testemunhar os fatos miraculosos de Juazeiro realizaram um ato de ascese, purificação e penitência. Os peregrinos daquele dia, como os romeiros de hoje, percorriam nesta estrada cheia de pedras e areias, aproximando-se do sagrado, meditando o corpo e a mente e realizando gestos de oração que fortalecem o sentido da vida nos espaços do mundo.
A experiência original da romaria de Juazeiro naquele julho de 1889, constitui o início de um novo tempo na vila que começa a receber centenas de pessoas, tornando o lugar mais populoso dos sertões. A casa do Padre Cícero era o abrigo dos pobres necessitados que ali vinham em busca de alimento, ajuda financeira e trabalho para fixar moradia em Juazeiro. A figura do padre Cícero com o espirito de acolhimento, atitude de conselheiro e guia espiritual vai arrebanhando uma legião de nordestinos que recorre ao Juazeiro, projetando o valor tão esperado de redenção de suas condições injustas e desumanas de vida e o sonho da salvação eterna.
Nestes 131 anos celebrados hoje das romarias a Juazeiro, resgatemos na nossa memória histórica esse acontecimento como uma semente plantada que hoje produz bons frutos de desenvolvimento socioeconômico, valores culturais e rica simbologia de fé e religiosidade popular. Se chegamos até aqui na história de Juazeiro do Norte, não esqueçamos da nossa história que foi protagonizada por muitos homens e mulheres que com sua teimosia, resistência, utopia e sonhos escolheram Juazeiro como o espaço sagrado e o Padre Cícero como seu padrinho e conselheiro do sertão.
Juazeiro do Norte, 07 de julho de 2020
José Carlos dos Santos
Professor de Filosofia da Universidade Regional do Cariri(URCA) e Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará(IFCE).
Nenhum comentário:
Postar um comentário