Antonio da Piçarra, histórias que ouvi contar. Por:José Cícero

Antônio da Piçarra

"No decorrer de uma producente viagem Cangaceira e deveras inesquecível que fizemos(Eu, Bosco, o bom francês Jack e Severo)com vistas a comemoração do 1º Centenário de nascimento de Maria Bonita em Paulo Afonso-BA, além de um verdadeiro Tur por Angico-SE, Delmiro Gouveia-AL, Serra Talhada –PE... dentre outros... Passamos inicialmente sob a batuta do Manoel Severo pela fazenda Piçarra(entre Porteiras e Jati) onde fomos recepcionados pelo gentman Vilson – neto do célebre coiteiro de Lampião. Ocasião em que presenciei a rica e proveitosa conversa que de modo conciso passei pro papel e, por via de conseqüência, o nobre confrade MENDES, além de ilustrar de modo formidável e sugestivo também publicara no seu Blog e eu, de novo e novamente aqui a transcrevo para os meus, apenas com alguns acréscimos do original pretérito. Vejamos então o que ora se segue: JC...


Mestre Severo! saudações catingueiras...


Ainda com relação ao que disse Vilson a mim, a você, Bosco André e Jack de Witte...O ótimo e fidedigno relato feito pelo Vilson Neto quando da nossa recente passagem com destino a Paulo Afonso na Bahia, diria que o mesmo constituiu um informe histórico dos mais relevantes, sobretudo para esclarecer "escritos", muitas vezes depreciativos com relação à suposta traição do Sr. Antonio da Piçarra - avô do Vilson atual proprietário-herdeiros da memorável fazenda. Confesso que fiquei sensibilizado no instante que o Vilson relatara o que o velho da Piçarra dizia acerca da coação que sofreu para proceder como tal.(ver a questão da suposta traição). Notadamente quando após o diálogo que teve com o sagaz tenente Arlindo Rocha(naquele ano) ante as ameaças veladas usando para tanto a inegável e conhecida ferozidade do chefe de volante nazareno Manoel Neto, que aliás já se encontrava na região. De modo que, sem saída e temendo pelos seus, o velho coiteiro assaz contrariado teve que ceder...


Lampião e grupo de cangaceiros em foto do inicio de sua vida no cangaço

No entanto, também não me esqueço da parte mais comovente segundo as palavras de seu neto naquele momento, quando todos nós estávam s ali sentados no mesmo banco caseiro e centenário que pertenceu ao velho. Um testemunho inanimado no qual a história parecia está ali mesmo ao alcance das nossas mãos. Uma relíquia doméstica, na qual certamente tanto o coiteiro quando Virgulino com parte do seu bando havia(como eu naquele instante histórico) também sentado. Seguia Vilson no seu diálogo informativo...

"Tendo desconfiado da grande demora de Antônio da Piçarra o cangaceiro Sabino se dirige para Lampião e fala de modo eufórico, quase esbaforido:

- Capitão, capitão. Tô achando que Antoi da Piçarra lhe traiu, pois tá demorando além da conta. Já era tempo dele ter vortado com as encomendas e tudo...

Ao que Lampião, com absoluta segurança replica:

- "De jeito nenhum. Isso não! Naquele eu confio sem medo. Se Antoi da Piçarra cavar um buraco no chão e mandar eu entrar, eu entro sem medo".
Depois de ouvir aquela resposta da própria boca de Lampião, Sabino de se afastou e deu as costas pra seu chefe mas, continuou olhando na direção do caminho... Permaneceu desconfiado daquela delonga atípica do velho coiteiro, que sempre foi rápido, leal e prestativo.



Conforme Vilson, o velho Antonio – seu avô, sempre contava essa história cabisbaixo (que ficou sabendo anos depois do trágico episódio).Sempre narrava as palavras de crédito de lampião com águas nos olhos... "Meu avô era uma homem forte e de palavra. Deve ter sofrido muito com tudo aquilo aquilo, disse. A família também lhe pressionou com temor das perseguições e represálias do Arlindo e do Manoel Neto. As notícias que chegavam não eram das mais boas. Eram de ameaças. E de que Lampião não estava "bom das pernas" com seu bando exausto e sem munição.

As lágrimas que fluíam sempre dos olhos do avô quando tocava no assunto era a maior prova de que sofreu sobremaneira quando teve que tomar aquela decisão de indicar onde se encontrava Virgulino(seu amigo) junto com seu bando. A segurança da sua prole, de certo modo falou mais alto no seu coração sertanejo daquele homem quase solitário naqueles grotões do mundo. Onde os ventos do cangaceirismo sempre(vez por outra) davam suas voltas.

- Há quem dissesse que depois desta suposta traição, Lampião jurara vingança de morte ao velho da Piçarra. Até piada disseram que fizera com isso. Mas, felizmente nada disso aconteceu. Seu Antonio viveu muito e deu adeus à vida no seu leito tranquilo.

Também nos olhos de Vilson, mesmo depois de tantos anos, puder perceber que aquele acontecimento, também de algum modo o tocava fundo no seu íntimo. Quem sabe aquela história o fizera provar do mesmo sentimento amargo que naquele tempo mexera com o seu velho avô dono da Piçarra. E eu cá comigo, pensei um pouco afastado olhando aquele chão onde tudo aconteceu. - De fato, a vida inteira para qualquer cristão do mundo é feita de escolhas. Mas, quantas escolhas ainda teremos que fazer?... Quantas opções difíceis e fatais todos têm que a elas se entregarem um dia por si mesmos, de corpo, alma, espírito e valentia em determinados momentos cruciais da vida.É, não deve ter sido nada fácil para o provecto coiteiro quase abandonado vivendo sua eterna lida nos rincões da sua fazenda Piçarra nas fronteiras de Brejo Santos, Porteiras e Jati.Talvez por isso, haveremos de compreender no seu contexto mais elástico a difícil e cruel decisão tomada pelo patriarca coiteiro Antonio da Piçarra.

Prof. José Cícero - Secretário de Cultura

Aurora-CE

3 comentários:

Luciano Ricardo disse...

Vi em outro blog que Antônio da Piçarra ajudou meu avô ainda criança. Ele era primo de Lampião e se chamava Domingos Paulo. A filha dele ainda vive. Como faço para entrar em contato? Queria saber mais.

Anônimo disse...

Tive a honra de conhecer o coronel Antonio da Piçarra e prazer de conversar com ele por diversas vezes na sua casa na fazenda Piçarra.

Anônimo disse...

eu conheço a fundo antônio piçarra: meu pai foi o vaqueiro dele durante 82 anos, eu e meu irmão,Ze domigos viamos ali,pai tônho assim que nois tratava ele,homem bom generoso