Manuel Marcelino, o Bom de Veras. Parte I - Por:Antônio Morais

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Manuel Marcelino, o Bom de Veras, o homem a quem Lampião temeu. Hoje, divulgamos palpitante entrevista sobre um dos mais temíveis componentes do celebre grupo de Lampião: Manuel Marcelino - O Bom de Veras. O nosso entrevistado é o agricultor António Taveira, residente na cidade pernambucana de Sitio dos Moreira. Na linguagem simples de homem da roça, habituado as agrurias da vida, incapaz de recuar diante das mil dificuldades que lhe surgem no dia-a-dia penoso do sertão, Antonio Taveira falou a Revista Região. Com seus 76 anos, natural da cidade cearense de Barbalha, Taveira, durante duas horas, conversou com o reporter. Estavamos na Casa Paroquial da pequenina cidade de Sitio dos Moreiras, ao lado deste formidavel e integro Mons. João Cancio, atraves do qual conhecemos o nosso entrevistado. 

A pergunta inicial foi formulada pelo proprio Mons. Cancio: Seu Antonio, por que Manuel Marcelino entrou nessa vida de cangaceiro? 
A: Tudo começou por causa de uma simples faca que o velho Ioiô Peixoto mandou tomar de João Marcelino, irmão de Manuel. Nesse tempo, o velho Ioiô era delegado de policia de Caririzinho, hoje distrito de Sitio dos Moreira. Joao Marcelino, cujo nome de guerra, na epoca do cangaço, era João Vinte e Dois, estava jogando baralho com alguns amigos. Como é comum no sertão, João trazia a cintura uma faca, dessas fabricadas na Paraiba. Uma excelente faca. Ze Benedito, preposto do delegado, a mando deste, foi desarmar João Marcelino. A arma foi entregue sob protesto deste: O que, Zé Benedito, eu entregar minha faca? Isso não. É melhor entregar. Voce sabe: A policia não pode ficar desmoralizada. Com a aproximação do Delegado e de seus soldados, a faca foi entregue a autoridade. Mais tarde, João Marcelino, julgando-se desmoralizado, procurou o delegado Ioiô, com quem manteve o seguinte dialogo:

Bem, Ioiô, pode ficar com a faca e fazer dela o que quiser. Não me interessa mais recebe-la. Já fui desmoralizado. Deixe de conversa mole. Voce é pagão. Converse pouco. Livra de apanhar. Apanhar? Sim. Voce sabe que tenho autoridade. Está bem. Mas voce vai ver. A conversa encerrou aí. João Marcelino dirige-se imediatamente a casa do Velho Daozinho Lopes, com quem trocou duas novilhas por um rifle papo-amarelo.Atendendo a uma pergunta do reporter, Antonio Taveira esclareceu que os Marcelinos eram filhos de Antonio Marcelino e Dona Nenen. Toda Familia ali morava na propriedade de nome Olho Dagua, a eles pertencente. 


Manuel Marcelino, o Bom de Veras, era vaqueiro de João Coelho no minadouro. É Taveira quem fala, retomando o fio da narração: Cedinho ainda, na Fazenda Minadouro, tipo alto, alourado e robusto, celava o cavalo para as costumeiras andanças pelo campo, no trato do gado. Com a aproximação inesperada do irmão, perguntou: O que houve, João? Voce por aqui tão cedo? Fui desmoralizado pelo o velho Ioiô. Contou toda historia da faca, no fim da qual o irmão pergunta indignado: Mas o velho Ioiô fez isso com voce? Realmente estamos desmoralizados, mas, nós vinga. A seguir retirou a sela e amarrou o animal num mourão. A decisão era irreversivel. Bom de Veras, em companhia do irmão foi a casa do Dino, agricultor residente nas proximidades, a quem comprou um rifle papo-amarelo e muita munição. Colocou a cartucheira à cintura e, em seguida, deu tres pulos mortais, um para frente, outro para traz e um terceiro para o lado, Isto ele costumava fazer para divertir o povo nas festas do Padroeiro. Finda a acrobacia, exclamou Bom de Veras: Fui vaqueiro... Agora sou cangaceiro. Penetrando numa vereda, desapareceu junto com o irmão. Durante oito dias ninguem teve noticias deles.

Certa noite, conta Taveira - "estando na minha casa, ouvi barulhos nas proximidades. A criação, assustada, denunciava algo de anormal. Saí. Eram os irmãos Marcelino. Ao ver-me, Manuel perguntou pelo velho Ioiô. Respondi-lhe que estava na rua. Sairam. Minutos depois, ouvi tiros. Disse para minha mulher maria: Os meninos estão matando o velho Ioiô. Desta feita, entretanto, não mataram o Delegado: deram-lhe a maior surra da paroquia. Cheio de escoreações, o velho IoIô foi curtir em casa a grande surra dos Marcelino. Passado o efeito daquele episodio, Ioiô Peixoto, contratou um pistoleiro. Negro forte e perverso, de nome Felizardo, passou a ser o mais comentado protetor do Delegado de Caririzinho. Quando tomava seus pileques, era verdadeira onça, a ponto de arrancar, com as unhas, carne do proprio rosto, num sadismo assustador e repugnante. Era uma fera esse Felizardo.

Continua...

Andanças e Lembranças.
Antônio Morais
postado no blog do Sanharol
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3 comentários:

Anônimo disse...

Esclarecendo algumas duvidas:
1 - Antônio Morais é o repórter.
2 - Antônio Taveira o entrevistado que na época da entrevista teria 76 anos. (quando teria sido?)
3 - O Monsenhor João Câncio, seria o mesmo que organizou a Missa do Vaqueiro, em Serrita?

Grato,

C Eduardo.

José Cícero disse...

Um texto rico e substacialmente fabuloso. Gostei.
Parabéns!!!
* José Cícero
Aurora-CE.
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www.jcaurora.blogspot.com
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www.blogdaaurorajc.blogspot.com

Unknown disse...

O Mons João Cancio é sim o mesmo da missa do vaqueiro.
Essa reportagem foi em 1976, visto que Seu Antônio Taveira faleceu em 1986 com 86 anos